23 junho 2017

Conhecendo a Deus e a si mesmo

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“Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus” (Jo 4.22).

Ao conversar com a mulher samaritana, Jesus fez uma grave afirmação. Ela adorava a quem não conhecia. Ao olhar para esse texto, devemos também pensar seriamente sobre nossa vida cristã e sobre o nível de maturidade e conhecimento do Senhor que temos.

Conhecer a Deus da maneira correta, isto é, como ele se revela em sua Palavra, deve ser o alvo de nossa caminhada cristã. Porém esse conhecimento não é somente saber muito sobre teologia ou explanar bem sobre qualquer assunto bíblico, mas, sobretudo, ter uma vida de relacionamento íntimo com ele aplicando as verdades reveladas nas Escrituras em nossa vida.

O povo de Israel foi duramente repreendido pelo Senhor justamente por esta falta de conhecimento. No livro de Isaías lemos: “O boi conhece o seu possuidor, e o jumento, o dono da sua manjedoura; mas Israel não tem conhecimento, o meu povo não entende” (Is 1.2). Por meio de Oséias o Senhor afirmou que esta era a causa da calamidade do povo, ao exortar: “O meu povo está sendo destruído, porque lhe falta conhecimento” (Os 4.6).

O verdadeiro conhecimento de Deus é muito importante principalmente em nossos dias, quando as pessoas dizem crer em Deus, mas não têm ideia alguma sobre o objeto de sua fé ou que diferença essa crença nele poderá causar. O conhecimento de Deus, de seus atributos, nos faz, por exemplo, descansar em sua soberania sabendo que, aconteça o que acontecer, ele está no comando.

Este conhecimento é possível porque o Senhor decidiu revelar-se por meio de sua Palavra. É na Bíblia que conhecemos a Deus. Não se pode conhecer o Senhor sem abrir as páginas da Sagrada Escritura e, com a iluminação do Espírito Santo, meditar de dia e de noite (Sl 1). Na Bíblia temos Deus falando com o seu povo e instruindo-o a respeito dele mesmo e a respeito do caminho em que o povo deve andar.

Quando Jesus afirmou que rios de água viva fluiriam do interior daqueles que cressem nele, não deixou de apontar qual é o lugar onde o homem pode obter o conhecimento para crer. Ele foi enfático: “Quem crer em mim, como diz a Escritura...” (Jo 7.38). Por isso, se você quer conhecer a Deus, deve ler a sua Bíblia.

É esse conhecimento de Deus que permite ao homem conhecer a si mesmo, mas o humanismo característico de nosso tempo leva os homens a tentarem entender a si mesmos, desprezando a Deus. Sobre isso, podemos aprender com Calvino, em suas Institutas da Religião Cristã, onde escreve:

“É notório que o homem jamais pode ter claro conhecimento de si mesmo, se primeiramente não contemplar a face do Senhor, e então descer para examinar a si mesmo. Porque esta arrogância está arraigada em todos nós – sempre nos julgamos justos, verdadeiros, sábios e santos, a não ser que, havendo sinais evidentes, sejamos convencidos de que somos injustos, falsos, insensatos e impuros. Mas não seremos convencidos se só dermos atenção a nós mesmos, e não também ao Senhor, pois esta é a regra única à qual é necessário que se ajuste o julgamento que se queira fazer” (Livro I, p. 54).

Esta foi a experiência de Isaías ao entrar no templo e contemplar o Senhor. O resultado de tamanha experiência foi a declaração: “Ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos”, e o perdão dos seus pecados, após esta confissão (Is 6.5-7).

Ou seja, o conhecimento de Deus é prático. Quanto mais conhecemos a Deus, mais nos conscientizamos de nosso estado pecaminoso, mais reconhecemos que necessitamos de sua misericórdia e que é essa misericórdia a causa de não sermos consumidos.

Como já foi afirmado e deve estar bem claro em nossa mente a fim de não nos ensoberbecermos: só podemos conhecer a Deus porque ele decidiu revelar-se a nós. E não só essa, mas todas as nossas ações em relação a Deus derivam de uma ação primeira efetuada pelo Senhor. “Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros...” (Jo 15.16); “Nós amamos porque ele nos amou primeiro” (1Jo 4.19).

Conhecer a Deus é conhecer a Cristo. Quando Filipe pediu a Jesus, “mostra-nos o Pai, e isso nos basta”, teve como resposta: “Há tanto tempo estou convosco, e não me tens conhecido? Quem me vê a mim vê o Pai” (Jo 14.8-9). Não há conhecimento de Deus à parte do seu Filho, sendo inclusive esta, a experiência de Isaías no Antigo Testamento. Interpretando o que houve no templo, João afirma que o profeta “viu a glória dele [de Cristo] e falou a seu respeito” (Jo 12.41).

Esta deve ser também a mais alta prioridade na vida de cada ser humano, pois, como disse Jesus em sua oração sacerdotal, “a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (Jo 17.3). Busque esse conhecimento com todo o coração, com toda força e com todo entendimento.

20 junho 2017

Deus cuida de nós enquanto cuidamos de outros – ou – Lições aprendidas ao aconselhar minha filha

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Filhos são herança do Senhor. Deus nos concede a bênção de ter filhos e, juntamente com isso, o privilégio e responsabilidade de instruí-los no caminho da justiça. De acordo com o texto de Deuteronômio esta instrução não deve acontecer somente em momentos específicos e/ou pontuais, mas as palavras ordenadas por Deus devem estar no coração dos pais para que “inculquem” e falem delas aos filhos “assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te” (6.7), ou seja, em todo o tempo.

Pais devem estar atentos a todas as oportunidades concedidas pelo Senhor para pastorear e ministrar ao coração dos filhos e hoje tive um desses momentos. Tenho dois lindos filhos, herança preciosa do Senhor, mas, como puxaram os pais, pecadores. Triste sorte, não fosse a esperança que há no evangelho do Redentor Jesus Cristo. Pela manhã um episódio simples serviu para eu ver como o Senhor Deus opera graciosamente em seus filhos.

Eu tinha pegado em uma lanchonete fast-food alguns gorros dos Smurfs de papelão, para montar, e Fernanda, minha filha mais velha, montou para ela e para Filipe, meu mais novo. Ele reclamou que o dele tinha rasgado e eu fui ver. Constatamos (eu e Fernanda) que não havia rasgado e que somente havia desencaixado uma parte da outra. Eu, entretanto, verifiquei também que Fernanda tinha encaixado da forma errada e disse isso a ela que prontamente respondeu: “Está certo, eu li as instruções”. “-Minha filha, está errado”. “-Não está não!”, falou ela já em tom choroso.

Como recentemente havia acontecido outros episódios em que ela não se deixava instruir, demonstrando todo o seu orgulho, eu lhe disse: “-Tá bom sabichona, você está certa”. Isso a deixou inquieta: “-Não sou sabichona”. “-É claro que é minha filha, você sabe mais que seu pai”, dizia eu enquanto ela me ignorava. Esta última atitude me fez falar de forma mais dura com ela que ouviu um pouco mais sobre o quanto estava sendo orgulhosa, sobre o não querer aprender e me viu ir para o quarto ajudar Filipe com outra coisa.

Não passou muito tempo, vem ela, chorosa, pedindo perdão. Perguntei a respeito da razão para o pedido e ela disse que era por ter me ignorado e ter sido orgulhosa. Como conselheiro bíblico que sou, vi então a oportunidade de ministrar ao coração da minha primogênita, afinal, conheço bem Deuteronômio 6! Falei que ela ainda estava em fase de aprendizado e que, por mais que já soubesse algumas coisas, ainda não sabia mais que o seu pai. Disse que o orgulho leva as pessoas a não aprenderem, pois se já entendem que sabem tudo, nunca irão querer aprender com outros. Disse ainda que Deus não se agrada de soberbos (Tg 4.6) e que o Senhor Jesus, a pessoa mais sábia que existe, era humilde, então, precisamos olhar para ele e buscar nele o desejo de ser semelhante ele é e que somente nele temos a ajuda para tudo isso.

Instruí que ela orasse pedindo perdão também a Deus por seu orgulho e para que ele a concedesse coração mais humilde, o que ela fez prontamente. Meu trabalho como pai e como conselheiro estava feito!

O que eu não esperava

Após a oração, Fernanda começou a chorar novamente. Pensei “com meus botões” que havia mais a ser tratado com ela e perguntei a razão do choro. Ela respondeu: “-O sr. debochou de mim, falou que não ia mais me chamar de sabichona e debochou de mim de novo”. Pensei, então, na minha falta!

Ela estava coberta de razão. Dias antes, por conta de seus episódios de orgulho em que achava saber mais do que eu, teimando a respeito das coisas mais bobas (por exemplo, sobre quem teria sido o descobridor do Brasil, ela insistia em D. Pedro I, confundindo as histórias) eu, que sou bastante cínico (um pecado contra o qual tenho de lutar e vigiar constantemente) comecei a chama-la de sabichona, com um tom de voz que ela entendeu acertadamente não se tratar exatamente de um elogio. Ela se ofendeu, disse que era pecado o que eu estava fazendo e que eu havia dito a ela que não faria mais isso, o que não cumpri no episódio que estou narrando aqui.

Agora pense comigo. O que seria o meu cinismo senão, também, uma demonstração de orgulho? Diante de uma criança que não se dobra à minha sabedoria, o deboche não seria uma tentativa de impor, pelo constrangimento, o que eu estava ensinando? Aqui ficou constado que ela tem o meu DNA, e ambos temos o dos nossos primeiros pais que, orgulhosos, deixaram de lado a instrução de Deus seguindo o caminho proposto pela serpente na ânsia de serem como o Senhor.

Confesso que na hora pensei em não admitir meu erro. Mesmo trabalhando com aconselhamento a tanto tempo sei que é bem fácil esquecer a primeira parte de Gálatas 6.1: “Irmãos, se alguém for surpreendido nalguma fata, vós, que sois espirituais, corrigi-o com espírito de brandura”. Ainda que eu estivesse falando com “brandura”, minha atitude foi parecida com a de um instrutor “calejado” ensinando a um aluno que ainda não sabia como agir. Pior ainda, isso revelou que não atentei para a segunda parte do versículo: “e guarda-te para que não sejas também tentado”. Minha filha confrontou em mim o mesmo pecado que eu estava percebendo nela e, pela graça de Deus, ouvi o que ela disse, afirmei que ela estava correta no que estava me cobrando, pedi perdão a ela e orei, junto com ela, pedindo perdão ao Senhor.

Conselheiros não devem olhar para os seus aconselhados como se fossem pessoas que já chegaram à perfeição e que agora podem ajudar aqueles que ainda não chegaram lá. É preciso lembrar que nossa realidade é a mesma do apóstolo Paulo que dizia: “Não que eu o tenha já recebido ou tenha já obtido a perfeição; mas prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus” (Fp 3.12). Como diz o título do excelente livro de Paul Tripp, somos apenas “Instrumentos nas mãos do Redentor – pessoas que precisam ser transformadas ajudando pessoas que precisam de transformação”.

Com esta experiência pude trazer à memória que ambos, eu e minha filha, precisamos a cada dia de um Redentor amoroso que não se cansa de formar em nós o seu próprio caráter (Gl 4.19), pois para isso o Pai nos escolheu, para sermos conformes a imagem de seu Filho (Rm 8.29). Em um momento que para mim seria apenas de instrução para minha filha acabamos, eu e ela, experimentando o amor gracioso do Salvador e Redentor de nossas vidas, que é o único que é perfeito e que, por isso, pode aperfeiçoar aqueles que estão a seus pés, Jesus Cristo, o Senhor!

02 junho 2017

Forrest Gump, Eclesiastes e Westminster

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Um dos filmes que marcou bastante os primeiros anos de minha mocidade foi Forrest Gump. Na história, Gump é um homem simples que vive no Alabama e que começa o filme sentado em um banco de um ponto de ônibus onde conta várias histórias de sua vida para as pessoas que vão se assentando ao lado dele. Em suas histórias ele viaja pelo mundo e é testemunha ocular de vários acontecimentos importantes na história, influenciando alguns deles. Vale a pena assistir o filme!

Eu o cito aqui porque uma das cenas que mais gosto é quando Forrest está assentado em uma varanda e resolve, como diz ele, “sem nenhuma razão especial, fazer uma pequena corrida”. Ele corre até o fim da estrada, depois até o fim da cidade e depois pelo condado. Ele, então, pensa: “já que cheguei até aqui, vou correr pelo estado”. E sucessivamente ele vai correndo para lugares cada vez mais longínquos “sem nenhuma razão especial”. Ele correu por 3 anos, 2 meses, 14 dias e 16 horas até que parou. Nesse tempo pessoas se ajuntaram a ele, o viam como uma inspiração. Alguns queriam saber se corria por alguma causa especial, etc. Quando parou, seus seguidores esperaram para ver o pronunciamento daquele que correra por tanto tempo. Ele olhou para aquelas pessoas e disse: “Eu tô muito cansado. Acho que vou para casa agora”. Voltou caminhando, deixando para trás os que o seguiam.

Em minha opinião, esta cena ilustra de forma formidável aquilo que Salomão escreveu muito, muito tempo antes: “Vaidade de vaidades, diz o Pregador; vaidade de vaidades, tudo é vaidade” (Ec 1.2). A palavra vaidade aqui significa aquilo que é vão, vazio. Salomão afirma ainda: “atentei para todas as obras que se fazem debaixo do sol, e eis que tudo era vaidade (vão) e correr atrás do vento” (Ec 1.14).

Para algum desavisado, Salomão soaria como um pessimista, que olha a vida como não tendo nenhum sentido, nenhuma razão, tal como a corrida de Gump. Esses, então, poderiam dizer que o que faltou para o corredor do Alabama e para os homens que Salomão descreve no Eclesiastes foi um propósito.

Entretanto, não é suficiente se ter um propósito. Uma boa ilustração disso está no capítulo 2. Alguns entendem, por exemplo, que um bom propósito para a vida está no trabalho, mas o pregador diz: “também aborreci todo o meu trabalho, com que me afadiguei debaixo do sol” (Ec 2.18). Mas porque Salomão chega a esta conclusão de que o trabalho é vão? A resposta está na continuação do versículo: “visto que o seu ganho eu havia de deixar a quem viesse depois de mim. E quem pode dizer se será sábio ou estulto? Contudo, ele terá domínio sobre todo o ganho das minhas fadigas e sabedoria debaixo do sol; também isto é vaidade” (Ec 2.18b-19).

Note bem! Para aquele que fez do trabalho somente um meio de construir um patrimônio, só restará a angústia de pensar o que seus herdeiros farão com tudo aquilo. Será que farão valer à pena? Será que colocarão tudo a perder? Para que trabalhar tanto se não há garantias de que sua obra perdurará? Isso seria semelhante à corrida de Gump que, após correr tanto, só teve como resultado o voltar cansado para casa.

É preciso, por tudo isso, saber qual é o propósito que faz a vida valer, de fato, à pena, e aí chegamos em Westminster. A resposta à primeira pergunta do Catecismo Maior, “Qual é o fim supremo e principal do homem?” é: “O fim supremo e principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”.

Com essa curta resposta, os teólogos de Westminster resumem muito bem o que Salomão ensina com maestria em Eclesiastes. Longe de ser um pessimista, o pregador ensina que à parte de Deus, não existe propósito algum que possa dar sentido à vida do homem. É por isso que no fim do livro ele afirma: “De tudo o que se tem ouvido, a suma é: Teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo o homem” (Ec 12.13).

O temor do Senhor, algo que foi perdido por conta da queda de Adão (e que levou o homem, por exemplo, a considerar seu trabalho um enfado) é restaurado novamente no homem que é redimido pelo Senhor Jesus Cristo. Somente aqueles que estão em Jesus Cristo podem compreender que a vida só tem sentido quando se vive para a glória de Deus. No Novo Testamento Paulo, então, ordena que quer comendo ou bebendo, o homem deve fazer tudo para a glória de Deus.

Em sua infinita graça e misericórdia, Deus concede àqueles que vivem para glorificar o seu nome a verdadeira alegria. Esta bênção pode ser notada também em Eclesiastes, quando Salomão afirma: “Nada há melhor para o homem do que comer, beber e fazer que a sua alma goze o bem do seu trabalho. No entanto, vi também que isto vem da mão de Deus, pois, separado deste, quem pode comer ou quem pode alegrar-se? Porque Deus dá sabedoria, conhecimento e prazer ao homem que lhe agrada; mas ao pecador dá trabalho, para que ele ajunte e amontoe, a fim de dar àquele que agrada a Deus. Também isto é vaidade e correr atrás do vento”. (Ec 2.24-26).

Só para continuar no exemplo do trabalho, aquele que trabalha para a glória de Deus, não estaria desesperado mesmo que viesse, futuramente, a perder todo o patrimônio, pois, por causa de Cristo, é possível viver contente em toda e qualquer situação (Fp 4.11).

Se você viver para si mesmo, terminará como Forrest Gump, voltando para casa cansado, sem ter nenhuma “meta” alcançada. Pior ainda, pois como afirmou Asafe, “os que se afastam de ti, eis que perecem” (Sl 73.27). Entretanto, se crer em Jesus Cristo e entender que o propósito para o qual você foi criado é glorificar a Deus e ter alegria nele para todo o sempre, além de poder gozar do fruto de seus trabalhos e realizações feitas aqui, debaixo do sol, para a glória de Deus, poderá desfrutar de sua presença bendita e da alegria verdadeira para todo o sempre!

Viva, portanto, para a glória de Deus!