27 abril 2023

A importância do catecismo para as crianças

ensino

Há uma música da Banda Resgate que eu aprecio bastante, apesar de haver um trecho problemático nela. A música se chama “Vou me lembrar” e o problema está aqui:

Lembre-se do pão que nunca nos faltou em meio à seca

De quem multiplicou e faz com que nenhum dos seus se perca

Que nunca foi alguém de carne e osso que nos fez mais nobres

Que não há mais ninguém melhor do que alguém que se fez pobre.

Ao mesmo tempo em que o autor convida a nos lembrarmos de Cristo, que multiplicou pão, que garante a salvação, que se fez pobre na encarnação, ele afirma “que nunca foi alguém de carne e osso que nos fez mais nobres.

Eu penso que a intenção era fazer um contraste entre Deus e os homens, pois na estrofe anterior ele diz para lembrar: “dos fariseus, que engordam com aquilo que é nosso; E dos mercenários que cobram pra nos dar o que é de graça”.

Entretanto, a frase “nunca foi alguém de carne e osso que nos fez mais nobres” acaba por negar um dos dogmas centrais da fé cristã, a saber, a encarnação. Não creio que o autor seja herege, penso apenas que ele não pensou na implicação do que estava escrevendo, pois na música está bastante claro que ele crê sim na encarnação. Mas que ficou bem ruim este trecho, ficou.

Pois bem, estava hoje escutando esta música e disse aos meus filhos, Fernanda de 13 e Filipe de 9 anos: “Gosto muito desta música, mas há um erro nela” e pedi para prestarem atenção na letra para ver se iam perceber o erro.

Quando chegou nesta parte da música minha primogênita disse: “É contraditório!” Perguntei a razão. Ela disse que era porque Jesus é um homem, ou seja, ele tem carne e osso. No mesmo momento Filipe emendou: “No catecismo mesmo não diz...” – pensou uns 3 segundos e falou – “...Cristo, o Filho de Deus, se fez homem para que pudesse sofrer toda a consequência de nossa natureza pecaminosa?”.

Ele citou a resposta da pergunta 48 (Então, como era possível que o Filho de Deus sofresse por nós?) do “Meu catecismo de doutrina cristã”, um catecismo mais resumido para crianças, que ele vem lendo e relendo há alguns anos e que Fernanda também lia, quando era menor.

Não é preciso mencionar o quão alegre fiquei com a resposta! Sim, vale à pena colocar as crianças para ler e aprender boa doutrina. Desde pequenos eles já têm condições a pensar no que ouvem e comparar com aquilo com o que estamos “enchendo seus corações”. Como afirmou Jesus, “o homem bom do bom tesouro do coração tira o bem, e o mau do mau tesouro tira o mal; porque a boca fala do que está cheio o coração (Lc 6.42).

É claro que eles estão sendo treinados para isso. Não basta simplesmente mandá-los decorar o catecismo e trechos das Escrituras. É preciso estimular a compreensão e comparação. Aqui em casa busco fazer isso quando, ao conversar sobre algum assunto, menciono: “lembra da pergunta tal, qual a resposta?” levando-os a associar o que foi decorado com o que estamos conversando, seja quando falamos sobre alguma desobediência, seja quando falamos sobre o ensino de algum filme ou desenho que assistimos.

Infelizmente, muitos têm subestimado as crianças e, em vez de boa doutrina, ocupam-se apenas (isto quando fazem) em ensinar histórias com lições morais, achando que eles ainda não têm condições de compreender doutrina.

Entretanto, ao olhar para a história, vemos nossos pais puritanos enfatizando bastante os catecismos e incentivando seu uso nos aos cultos domésticos. Samuel Lee (1625-1691) tratando da “conversão dos membros da família” afirma que

acima de tudo, o melhor modo de instrução, especialmente quanto aos pequeninos, deve ser realizado por catecismos – perguntas e respostas em um método curto e conciso – cujos termos, sendo claros e distintos, podem ser formulados das Sagradas Escrituras e ajustados às suas capacidades por um estilo simples, embora sólido e às suas memórias por expressões breves (Piedade no lar. Nadere Reformatie Publicações).

Vivemos tempos difíceis! É preciso educar os filhos no temor do Senhor, preparando-os para testemunhar de Cristo em meio a uma “geração pervertida e corrupta, na qual resplandeceis [eles devem resplandecer] como luzeiros do mundo” (Fp 2.15). Como escreveu Horton:

Nos tempos de grande perseguição ou de secularismo profundo e dominante, o povo de Deus sempre dobrou os seus esforços nos deveres para com a família: filhos são instados a decorar o catecismo sob a tutela de pais piedosos que modelam a visão cristã da vida tanto por seus ensinos quanto por seu exemplo pessoal. Isso não quer dizer que eles se tornam mais rígidos e sérios em suas personalidades, mas que se tornam mais apaixonados pela Palavra de Deus e por seu impacto sobre o círculo de crentes mais próximos deles. Portanto, o lar torna-se em refúgio, uma “pequena igreja”, como Lutero disse -- até mesmo um “pequeno seminário” onde os filhos sabem pelo menos bastante sobre o que creem e por que creem para distingui-los do mundo descrente (Michael Horton. O cristão e a cultura – grifos meus).

Invista no discipulado de seus filhos. Ainda que você não consiga fazer isso todos os dias, eu mesmo tenho minhas dificuldades, não negligencie o grande privilégio e responsabilidade concedida pelo Senhor de formar neles o caráter de Cristo. Para isto, temos muitas boas ferramentas. Atualmente estamos usando em um dos dias da semana, nos cultos domésticos, o excelente “Breve Catecismo de Westminster para classes de estudo” publicado pela Clire.

Coloque isto como propósito diante do Senhor. Peça a ele sabedoria e disposição a fim de cumprir o mandamento de criar seus filhos sob a disciplina e admoestação do Senhor (Ef 6.4).