É preciso recorrer ao Manual Presbiteriano a fim de pensarmos na questão. Primeiramente chamo a atenção ao que preceitua o Art. 3 da CI/IPB: “O poder da igreja é espiritual e administrativo, residindo na corporação, isto é, nos que governam e nos que são governados”.
O §2º do mesmo artigo explica como se dá o exercício de autoridade dos que governam: “A autoridade dos que governam é de ordem e de jurisdição. [...] É de jurisdição, quando exercida coletivamente por oficiais, em Concílios, para legislar, julgar, admitir, excluir ou transferir membros e administrar comunidades” (destaques meus).
Atente bem aos destaques, pois estas expressões são imprescindíveis para entender o que vem a seguir.
Concílios, conforme a CI/IPB “são assembleias constituídas de ministros e presbíteros regentes” (Art. 59). São eles: “Conselho da Igreja, Presbitério, Sínodo e Supremo Concílio” (Art. 60). O artigo 61 afirma que casa um deles exerce “jurisdição original e exclusiva sobre todas as matérias da sua competência”.
Ao tratar dos membros do Concílio, a CI estabelece diferenças: Somente membros “efetivos”, a saber, “ministros e presbíteros que constituem os Concílios, bem como o presidente da legislatura anterior” (Art. 66 letra “a”) têm o direito de votar. Os membros “ex-offício” (letra b) e “correspondentes” (letra c) podem usar a palavra, mas sem direito a voto e no caso de membros “visitantes”, sequer podem fazer uso da palavra, podendo apenas tomar assento na reunião (letra d).
Agora preste bem a sua atenção ao Parágrafo único deste artigo: “O disposto na alínea b deste artigo não se aplica aos Conselhos”. Qual a razão de ser deste parágrafo?
O Art. 75 reza que “o Conselho da Igreja é o Concílio que exerce jurisdição sobre uma Igreja e é composto do pastor, ou pastores, e dos presbíteros”. Lembre-se de que a jurisdição “é exercida coletivamente por oficiais, em Concílios, para legislar, julgar, admitir, excluir ou transferir membros e administrar comunidades”.
Para exercer jurisdição sobre a igreja o Conselho precisa votar! Se a jurisdição é exercida coletivamente por docentes e regentes, todos precisam ter direito a voto, mas ao olhar para o Art. 78 em seu § 3º nota-se que “havendo mais de um pastor, a presidência será alternada, salvo outro entendimento; se todos estiverem presentes, o que não presidir terá direito a voto”.
É preciso entender bem este parágrafo, pois é a partir dele que surge a controvérsia acerca de o presidente do Conselho poder ou não votar.
O Art. 30 define que “o Ministro do Evangelho é o oficial consagrado pela Igreja, representada no Presbitério, para dedicar-se especialmente à pregação da Palavra de Deus, administrar os sacramentos, edificar os crentes e participar, com os presbíteros regentes, do governo e disciplina da comunidade”, ou seja, junto com os regentes ele tem jurisdição sobre a igreja.
Estou insistindo na questão da jurisdição por uma razão importante. O Art. 33 estabelece que “o ministro poderá ser designado pastor efetivo, pastor auxiliar, pastor evangelista e missionário”. Ao olhar para a definição de cada um deles você percebe que o Efetivo é eleito pela igreja ou designado pelo Presbitério. Ele tem jurisdição sobe a igreja, junto com os regentes (§ 1º).
Entretanto, “é pastor auxiliar o ministro que trabalha sob a direção do pastor, sem jurisdição sobre a Igreja, com voto, porém, no Conselho, onde tem assento ex-officio [...]” (§2º).
Aqui você já percebe algumas coisas. Primeiramente a razão de haver o parágrafo único do Art. 66. Lá é dito que membros ex-officio dos concílios “gozam de todos os direitos, menos o de votar”, exceto no caso de Conselho da Igreja, concílio em que o ministro tem assento ex-officio com direito à voto.
Algo deve chamar a sua atenção aqui! Se o pastor auxiliar não tem jurisdição sobre a Igreja, por que razão ele tem direito à voto, visto que é por meio do voto que o Ministro participa “com os presbíteros regentes, do governo e disciplina da comunidade” (Art. 30)? Voltemos, então, ao Art. 78 § 3º:
a) “Havendo mais de um pastor” – Um efetivo e seu auxiliar;
b) “a presidência será alternada, salvo outro entendimento” – Como o auxiliar trabalha “sob a direção” do efetivo, cabe a este definir se haverá ou não alternância;
c) “se todos estiverem presentes, o que não presidir terá direito a voto” – O espírito da lei aqui parece ser o de impedir que o efetivo tenha “dois votos”. O dele, por direito, e o do auxiliar que trabalha sob sua direção.
Considerando que o auxiliar não tem jurisdição sobre a Igreja, em tese, ele nem precisaria estar presente na reunião, por não ter direito a voto. Neste caso, havendo somente o Pastor efetivo na reunião ele vota livremente em qualquer matéria, caso entenda que deva. É seu direito constitucional e dever de ofício na jurisdição da Igreja junto aos regentes.
Entretanto, caso todos estejam presentes, somente o que não presidir terá direito a voto. Desta forma, ou o Pastor Efetivo, se quiser votar, passa a presidência ao auxiliar, ou, se preferir presidir, dá ao auxiliar o direito de voto.
Desta maneira, somente em Igrejas em que haja mais de um pastor é que o Presidente do Conselho não pode votar. Se não for assim, estaremos diante de uma situação, no mínimo, estranha em que um Pastor efetivo, eleito ou designado, é impedido de exercer jurisdição sobre a Igreja, enquanto o auxiliar, que a CI/IPB afirma categoricamente não ter jurisdição sobre a Igreja, ganha o direito de... “jurisdicionar a Igreja por meio do seu voto”. Isto é claramente contraditório.
Ao consultar o Digesto Presbiteriano percebe-se que desde 1970 tem sido entendimento da Igreja Presbiteriana do Brasil que o Presidente pode votar, como segue:
“CE - 1970 - DOC. LX: Consulta Sobre Voto de Desempate - Doc. LVII - Quanto ao Doc. 57, consulta sobre voto desempate pelos presidentes de concílios, a CE-SC/IPB: [...] resolve: Reconhecer ao Presidente de um concílio o direito de dar o seu voto nos casos de empate, independentemente do seu direito de votar também como membro efetivo do seu concílio.”
“CE - 2003 - DOC. VI: Quanto ao Doc. 75 da CE/SC-IPB 2003: Quanto ao Documento 17, da CE-SC/2002, encaminhando documento do Sínodo Norte Paulistano, que por sua vez, encaminha documento do Presbitério Norte Paulistano, solicitando que o SC-IPB tome nula a resolução SC-90 Doc. CXL, sobre voto de desempate nos Concílios. Considerando: 1 – Que o presidente de um Concílio é seu membro efetivo (Art. 66, alínea “a” CI-IPB), tendo, portanto direito a votar, como os demais membros efetivos; 2) Que o presidente de um Concílio, em caso de empate em uma votação, inclusive quanto da eleição da Mesa, deve dar o seu voto de desempate, nada obstante, ter votado anteriormente (Art. 8, alínea “I” RI-SC-IPB e outros); 3 – Que mesmo causando-lhe certo constrangimento é seu dever de ofício proceder a este ato; 4 – Que certamente ao fazê-lo não será movido por questões pessoais, mas levando em consideração o bem do Concílio e sua consciência. O Supremo Concílio Resolve: 1 – Revogar a resolução SC/90, Doc. CXL. 2 – Reiterar quem em casos desta natureza, o presidente exerça livremente o seu dever constitucional”.
“SC - 2018 - DOC. CCXVIII: Quanto ao documento 227 – [...] Resolve: [...] 4. Esclarecer que o critério de desempate a ser adotado nas eleições para os cargos da mesa Diretora e nas demais decisões dos Presbitérios será o voto do Presidente, nada obstante o seu direito de ter votado anteriormente, como membro efetivo de seu Concílio; 5. Reconhecer a vigência da Resolução Doc. 060 da CE-SC/IPB-1970;”
Diante do exposto, fica evidente que o Presidente do Conselho, bem como os presidentes dos demais concílios da IPB tem direito a votar as matérias livremente e, se for o caso, por dever de ofício, dar também o voto de desempate.
Neste ponto, pensando na questão ética e no espírito da lei, coloco duas questões:
1. Poder e dever são duas coisas bem distintas. Particularmente, creio que o pastor não deve se furtar de votar nas matérias que envolvem o pastoreio da Igreja (jurisdição), mas que deve se abster quando se tratar de matéria que o envolva diretamente, como por exemplo, aumento salarial. Imagine, por exemplo, um cenário em que o resultado ficou 3 x 2 com o voto dos regentes e o docente usa seu direito de voto para empatar e posteriormente desempatar a matéria. A não ser que seja o caso de ele votar e desempatar em desfavor próprio, em minha opinião a atitude seria imoral;
2. Uma segunda questão diz respeito ao que temos em algumas Igrejas hoje e que, certamente, não era comum em 1950 quando foi promulgada a CI/IPB, o fato de haver igrejas com mais de um pastor auxiliar. Digo isto porque o texto constitucional afirma que “se todos [os pastores] estiverem presentes, o que não presidir terá direito a voto”. Perceba que não são os que não presidirem, mas o que não presidir.
Imagine o caso de um Efetivo que tenha 6 regentes e 4 pastores auxiliares. Estando os auxiliares sob sua direção, não é incomum que votem com o “chefe”. Desta forma, bastariam dois regentes para o pastor efetivo aprovar o que quisesse na igreja. Isso mata o sistema presbiteriano!
Talvez aqui alguém objete que há Efetivos que deixam seus auxiliares livres para votar como quiserem, mesmo que seja contra a sua posição. Ainda que aconteça, entendo que está errado, pois 4 pastores auxiliares que não foram eleitos pela igreja e que não tem jurisdição sobre ela estariam decidindo as matérias, usurpando o direito dos regentes que foram devidamente eleitos pela igreja e que, em decorrência disso, têm sobre ela a jurisdição espiritual.
Neste caso, apesar de a letra fria da lei permitir que todos os auxiliares votem por não estarem presidindo, penso que tal ato vai contra o espírito da lei que promove o pastoreio por parte do Conselho, a saber, presbíteros eleitos pela igreja e o pastor eleito ou designado pelo presbitério para tal fim, estes sim, com pleno direito de governar os que estão sob sua jurisdição.
Penso que este entendimento pode colocar fim às disputas carnais que muitas vezes ocorrem no âmbito da Igreja, onde Ministros querem se valer dos seus auxiliares para executar sua vontade e presbíteros querem tratar pastores efetivos como meros executores daquilo que eles decidem “sozinhos”, sem o voto do Presbítero Docente que foi igualmente eleito pela igreja. É bom lembrar que “o presbítero tem nos Concílios da igreja autoridade igual a dos ministros” (CI/IPB Art. 52). Notem bem, não superior, nem inferior, mas igual.
Desta forma, em suas decisões, o Concílio pode afirmar sem hipocrisia: “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós” (At 15.28) e, sujeitos a Cristo, o Supremo Pastor, presbíteros docentes e regentes podem pastorear fielmente o rebanho que lhes foi confiado, para a glória de Deus!
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