28 fevereiro 2019

A importância da teologia no aconselhamento


Certa vez, alguns dias após uma aula que ministrei em um treinamento de aconselhamento bíblico, fui indagado por um irmão a respeito de uma afirmação que eu havia feito na classe. Eu havia ensinado que incorremos em idolatria todas as vezes que pecamos para conseguir o que queremos ou quando pecamos porque não conseguimos o que queremos. Essas atitudes (pecados) deixariam claro que o coração está sendo governado por um (ou mais) ídolo(s) e não pelo Senhor.

Para exemplificar, falei sobre a história de Jacó. Desde que viu a Raquel pela primeira vez ele havia se apaixonado e trabalhou sete anos para o seu sogro, a fim de casar com a moça. Labão, aproveitando-se da situação, conduziu a filha mais velha, Lia, para o casamento e eles coabitaram, fato que só foi notado por Jacó no dia seguinte, pela manhã. Jacó, que já estava casado, topou trabalhar mais sete anos e casou-se também com Raquel, estabelecendo uma bigamia e incorrendo em adultério, o que é pecado (Gn 29.1-30). Com isso, eu disse que podíamos perceber que o amor de Jacó por Raquel dominava o seu coração e ele agia em função disso e não segundo a Lei do Senhor.

A indagação foi, então, a respeito da minha afirmação de que Jacó havia adulterado. O irmão entendia que não havia adultério naquela relação, pois era um período pré lei e aquele casamento era legítimo na cultura em que vivia Jacó. Minha resposta foi que tudo dependeria da forma como se compreende o Pacto de Deus com o homem e que a afirmação dele tinha como pressuposto a ideia de que antes do Sinai não havia ainda os dez mandamentos, incluindo o sétimo, não adulterarás.

Antes de explicar o que está por trás da minha afirmação, preciso mencionar algo importante. Muitas pessoas, ao pensar em aconselhamento bíblico, entendem que ele consiste apenas em atirar alguns versículos isolados, geralmente fora do contexto, na cabeça das pessoas e as exortarem a se adequar ao que o texto está dizendo. Daí entenderem que é necessário o encaminhamento a profissionais, especialistas no cuidado da alma, que estudaram e sabem do que estão falando. Entretanto, como afima Kellemen,

“quando pessoas [...] pedem ajuda e esperança, a igreja não tem que se sentir inferior e encaminhá-las a ‘especialistas de fora’. Nós não temos de borrifar uns poucos princípios cristãos à sabedoria mundana. Nós não temos que seguir a rasa abordagem de concordância de um problema, um versículo, uma resposta[1].

Longe disso! Em vez disso, John Babler aponta o caminho correto:

“Adquirir uma perspectiva bíblica equipa o conselheiro para a tarefa de corrigir o que foi arruinado pela busca pecaminosa de uma sabedoria inadequada. O conselheiro deve trabalhar diligentemente na exegese e na compreensão das Escrituras. À medida que as Escrituras revelam o caráter de Cristo, homens e mulheres podem conhecer a Deus. Uma pessoa nunca mais será a mesma depois de ter conhecido a Deus”[2].

Conselheiros precisam estudar teologia, pois o conselho de Deus emana da sã doutrina expressa nas páginas da Escritura Sagada que, nas palavras de Paulo, “é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2Tm 3.16-17). “O uso superficial, não-teológico da Bíblia confunde e desencoraja os consulentes (assim como representam mal Deus pela má compreensão do ensino da Bíblia)”[3].

Volto, então, à minha afirmação a respeito do adultério de Jacó. Como pastor presbiteriano, subscrevo as Escrituras Sagradas do Velho e Novo Testamento como única regra de fé e prática, bem como a Confissão de Westminster e seus Catecismos Maior e Breve como sistema expositivo de doutrina. Este é meu norte teológico.

Como afirmei ao irmão que me indagou, esta é uma questão diretamente ligada à doutrina do Pacto. Creio que Deus estabeleceu com Adão, e nele com sua posteridade, o que é chamado de Pacto de Obras em que a vida lhe foi prometida “sob a condição de perfeita obediência pessoal” (CFW VII.II). Onde estava o padrão para a obediência de Adão? O Catecismo Maior responde na “Pergunta 92. O que Deus revelou primeiramente ao homens como regra de sua obediência? Resposta: A regra de obediência revelada a Adão, no estado de inocência, e a todo gênero humano nele, além do mandamento especial de não comer do fruto da árvore da ciência do bem e do mal, foi a lei moral”. Para não restar dúvidas de que o ensino confessional aponta para a Lei já presente no Éden, basta olhar para a resposta à “Pergunta 98. Onde se acha a lei moral resumidamente compreendida? Resposta: A lei moral acha-se resumidamente compreendida nos Dez Mandamentos, que foram dados pela voz de Deus no monte Sinai [...]”.

Talvez aqui, aqueles que não estão acostumados com o ensino da Confissão de Fé de Westminster perguntem: E onde está isso na Bíblia? Pergunta importante que, creio eu, seja fácil de responder.

Ao criar o homem o Senhor o fez segundo a sua própria imagem e semelhança (Gn 1.26-28). Isso significa que o homem foi criado santo, como Deus é Santo. Sendo a Lei a expressão do caráter de Deus ela também não poderia ser outra coisa, senão o que afirma Paulo: “Por conseguinte, a lei é santa; e o mandamento, santo, e justo, e bom (Rm 7.12). Nesta mesma epístola aos romanos Paulo afirma que “quando os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos. Estes mostram a norma da lei gravada no coração (Rm 2.13-14). Ou seja, ainda que Paulo esteja tratando do cumprimento externo da lei, ele afirma que a norma da lei está gravada no coração do homem e isso decorre de, mesmo caído, ele ainda ser imagem e semelhança de Deus.

Nos Dez Mandamentos temos a expressão da Lei após o pecado, que consiste em mostrar ao homem qual é o padrão estabelecido no início à Adão. Tome como exemplo o sexto mandamento, não matarás. Onde você o encontra no Éden? Ele pode ser visto de forma positiva na ordem dada ao homem para que trabalhasse no Jardim. Como você pode ter certeza disso? Basta olhar a aplicação que Paulo faz do mandamento para uma vida de santidade, ao afirmar: Aquele que furtava não furte mais; antes, trabalhe, fazendo com as próprias mãos o que é bom, para que tenha com que acudir ao necessitado” (Ef 4.28). O que você pode perceber é que para cumprir o sexto mandamento não basta deixar de roubar. O contrário de roubar não é deixar de roubar, mas trabalhar e doar. O mandamento é dado de forma negativa no Sinai, porque deixou de ser praticado de forma positiva, em decorrência da queda do homem.

Com respeito ao adultério, a Lei está da mesma forma presente no Éden, por ocasião da criação. Deus faz um homem para uma mulher. Aqui está o estabelecimento do casamento heterossexual, monogâmico e perene. Qualquer atitude fora desse padrão constitui-se pecado, mesmo antes do Sinai. Atente à narrativa de Gênesis e você perceberá que a primeira quebra do casamento monogâmico acontece com Lameque, um descendente de Caim que se orgulha de ser pior que seu antepassado (Gn 4.19-24). É interessante notar que quando os fariseus questionam a Jesus a respeito do divórcio por qualquer razão, curiosamente a Lei citada por Jesus não foi a dada por Moisés no Sinai, mas a que foi dada por ocasião da criação: "Não tendes lido que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e que disse: Por esta causa deixará o homem pai e mãe e se unirá a sua mulher, tornando-se os dois uma só carne?" (Mt 19.4.5, cf Gn2.24).

Avance na leitura de Gênesis e veja o que aconteceu nos dias de Noé. Por causa da maldade que aumentou ao extremo o Senhor resolveu dar cabo de toda carne, mas preservou, pela graça, a Noé e sua família. Após sair da Arca, Deus restabeleceu o Pacto com Noé e ele ouviu as mesmas palavras que Adão ouvira na criação, “sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra” (Gn 9.1). Não é estranho, então, o fato de Deus ter preservado um homem que tinha um casamento conforme a lei dada na criação, ou seja, que tinha somente uma esposa, a despeito de a poligamia já ser algo comum nos tempos de Noé.

Sabemos que, culturalmente, a bigamia era praticada nos tempos do Antigo Testamento, mas isso não prova que ela era permitida, antes, aponta para o fato inconteste de que os homens quebram a Lei do Senhor desde a queda de Adão. Isso fica ainda mais claro quando Jesus afirma que o simples olhar de forma impura para uma mulher já é quebra do sétimo mandamento. Daí os mandamentos dados no Sinai apontarem para o padrão estabelecido por ocasião da criação, no Pacto feito com Adão e seus descendentes.

Quando um conselheiro está diante de um caso de adultério, ele não pode simplesmente dizer: pare de adulterar! Junto com isso ele precisa demonstrar o padrão estabelecido por Deus, em acordo com o seu caráter Santo e a impossibilidade de o homem, sem Cristo, se adequar a esse padrão. Desta forma, o aconselhado será direcionado ao Senhor Jesus Cristo, o único que cumpriu perfeitamente a todos os mandamentos. Esta é a beleza expressa na doutrina do segundo Pacto, o Pacto da graça, que conforme o ensino do Catecismo Maior “foi feito com Cristo, como o segundo Adão; e nele, com todos os eleitos, como sua semente” (Pergunta 31).

Foi esta graça que alcançou a Noé e o capacitou a adequar-se ao mandamento de não adulterar. Seus aconselhados precisam entender que esta graça está disponível a todos os que creem em Cristo, pois como ensina a pergunta 32 do Catecismo Maior,

“a graça de Deus é manifestada no segundo pacto em ele, livremente, prover e oferecer aos pecadores um Mediador e a vida e a salvação por ele; exigindo a fé como condição de interessa-los nele, promete e dá o Espírito santo a todos os seus eleitos, para neles operar essa fé, com todas as demais graças salvadoras, e para os habilitar a praticar toda a santa obediência, como evidência da sinceridade da sua fé e gratidão para com Deus, e como o caminho que Deus lhes designou para a salvação”.

Meus irmãos, não se aventurem a aconselhar uns aos outros sem antes dedicar-se a um estudo sério da Palavra de Deus. Não seja um salpicador de versículos, mas alguém que busca compreender os textos dentro de seus devidos contextos a fim de aplica-los com sabedoria às circunstâncias enfrentadas por aqueles que sofrem e que pedem ajuda. Aconselhamento bíblico implica conhecimento teológico. Procure, então, “apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2Tm 2.15).


[1] Robert Kellemen. Aconselhamento segundo o Evangelho. p. 41 – Ed. Cultura Cristã

[2] Jonn Babler (editor). Fundamentos teológicos do aconselhamento bíblico. p. 98 – Ed. Nutra

[3] Jay Adams. Teologia do aconselhamento cristão. p. 30 – Ed. Peregrino

16 fevereiro 2019

Deus ouve a oração de um ímpio?

Esta questão surgiu dia desses em um grupo de discussões de nossa igreja quando um irmão nos deu a conhecer uma posição que defende que em virtude da graça comum, manifestada igualmente a crentes e não crentes, o Senhor ouve sim a oração de um ímpio, sendo a oração de Cornélio, no livro de Atos, uma demonstração disso.

O assunto é importante e precisa ser bem entendido, sobretudo, para nós presbiterianos, por uma perspectiva confessional. Deus ouve mesmo a oração de alguém que não o tema?

Olhemos primeiro para a resposta à pergunta 178 do Catecismo Maior de Westminster: “O que é oração? Resposta: Oração é um oferecimento de nossos desejos a Deus, em nome de Cristo e com o auxílio do seu Espírito, e com a confissão de nossos pecados e um grato reconhecimento de suas misericórdias” (destaque meu). Aqui já está clara a impossibilidade de se achegar a Deus sem um Mediador, que sabemos pela Escritura ser o Senhor Jesus Cristo, como afirmou Paulo a Timóteo: “Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5).

É isto que está também na pergunta 181, onde a questão é o porquê da necessidade de se orar em nome de Cristo, tendo como resposta o fato de que “o homem, em razão do seu pecado, ficou tão afastado de Deus que ele não se pode chegar sem ter um Mediador” – e enfatizando – “e não havendo ninguém, no céu ou na terra, constituído e preparado para esta gloriosa obra, senão Cristo unicamente, o nome dele é o único por meio do qual devemos orar”.

Temos um pouco mais na pergunta 154, “quais são os meios exteriores pelos quais Cristo nos comunica os benefícios de sua mediação?”. O ponto aqui são as bênçãos que temos por sermos representados por Cristo e a resposta é clara: “Os meios exteriores e ordinários, pelos quais Cristo comunica à sua Igreja os benefícios de sua mediação, são todas as suas ordenanças, especialmente a Palavra, os Sacramentos e a Oração; todas essas ordenanças se tornam eficazes aos eleitos em sua salvação”.

Para corroborar, veja a resposta à pergunta 117, “Como devemos orar, para que a oração seja agradável a Deus e ele nos ouça?” de outro Catecismo reformado, o Catecismo de Heidelberg: “Primeiro: devemos invocar, de todo o coração, o único e verdadeiro Deus, que se revelou a nós em sua palavra, e orar por tudo o que Ele nos ordenou pedir. Segundo: devemos muito bem conhecer nossa necessidade e miséria, a fim de nos humilharmos perante sua majestade. Terceiro: devemos ter a plena certeza de que Deus, apesar de nossa indignidade, quer atender à nossa oração, por causa de Cristo, como Ele prometeu em sua Palavra”.

Diante disso, parece estar claro que o ensino confessional aponta para a impossibilidade de um ímpio ser ouvido por Deus em sua oração. Mas de nada adianta o ensino confessional ser este, se for correto o entendimento de que o ímpio Cornélio tenha sido atendido por Deus, sendo esta a prova de que por causa da graça comum Deus ouviria um descrente.

Vamos olhar para o texto de Atos para ver se as coisas são de fato assim, mas já afirmo de antemão que se Deus, por causa da chamada graça comum, ouviu a oração de um ímpio, segue-se que há possibilidade de se achegar a ele sem o Mediador Jesus Cristo. Pense! Sem o Mediador, um ímpio orou e foi atendido pelo Senhor. Será que é isto que temos na história de Cornélio?

É claro e verdadeiro que Cornélio não conhecia a Jesus. A prova disso é que Pedro é enviado por Deus para pregar a ele, após ter o seu coração tratado para ir ver um gentio, já que os judeus os viam como impuros. A despeito disso, Lucas começa a narrativa afirmando que “morava em Cesaréia um homem de nome Cornélio, centurião da coorte chamada Italiana, piedoso e temente a Deus com toda a sua casa e que fazia muitas esmolas ao povo e, de contínuo, orava a Deus” (At 10.1-2). Perceba que o texto não descreve Cornélio como um ímpio que clamou a Deus em um tempo de aflição, mas como um homem piedoso que de contínuo orava a Deus. Além disso, em sua visão o anjo lhe disse: “As tuas orações e as tuas esmolas subiram para memória diante de Deus” (10.4).

Cornélio, notadamente, não era um ímpio, mas ele também não conhecia a Jesus, como já afirmei anteriormente. Como pode ser isso?, você pode perguntar. É preciso, então, mais uma vez, lembrar do nosso ensino confessional: Jesus Cristo é o Mediador do pacto da graça! Ao tratar do Pacto, temos na pergunta 33 do Catecismo Maior: “Foi o pacto da graça sempre administrado de uma maneira?”, a seguinte resposta: “O pacto da graça não foi administrado da mesma maneira; mas as suas administrações no Velho Testamento eram diferentes das debaixo do Novo”.

“O pacto da graça foi administrado no Velho Testamento por promessas, profecias, sacrifícios, pela circuncisão, pela páscoa e por outros símbolos e ordenanças, todos os quais tipificaram o Cristo, que havia de vir e eram naquele tempo suficientes para edificar os eleitos na fé do Messias prometido, por quem tiveram, ainda nesse tempo, a plena remissão do pecado e a salvação eterna.” (resposta à pergunta 34 do CMW).

Cornélio era um homem temente a Deus, pois já havia conhecido a fé dos judeus e, ainda que não fosse circuncidado, possivelmente frequentava a sinagoga, guardava as leis e as dietas alimentares dos judeus (conforme comentário de Atos – Kistemaker). Ou seja, Cornélio era um crente nos moldes do Velho Testamento, que cria na vinda do Messias. Quando Jesus foi apresentado a ele como sendo o Messias, ele logo creu! Deus não ouviu a oração de um ímpio, mas a oração mediada pelo Senhor Jesus Cristo.

A prova disso foi o anjo ter-lhe dito que suas obras subiram até Deus. Mais uma vez, lembro nosso ensino confessional, agora sobre as boas obras: “Estas boas obras, feitas em obediência aos mandamentos de Deus, são o fruto e as evidências de uma fé viva e verdadeira” (CFW XVI.II), “sendo aceitas por meio de Cristo as pessoas dos crentes, também são aceitas nele as boas obras deles, não como se fossem, nesta vida, inteiramente puras e irrepreensíveis à vista de Deus, mas porque Deus considerando-as em seu Filho, é servido aceitar e recompensar aquilo que é sincero, embora seja acompanhado de muitas fraquezas e imperfeições” (CFW XVI.VI).

Deus não ouve a oração de ímpios, pois como afirmou Salomão, “o que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até a sua oração será abominável (Pv 28.9). Isso deve levar você a louvar e agradecer a Deus por ser aceito por ele por causa do Redentor amado, Jesus Cristo e também a proclamá-lo àqueles que ainda não o conhecem na esperança de que, pela ação do Espírito Santo, eles se convertam e também sejam aceitos e ouvidos pelo Pai.

12 fevereiro 2019

Entendimento, raiz das ações e sentimentos

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João Batista apareceu pregando arrependimento e batizando no Jordão, para onde afluíam muitos a fim de serem batizados por ele. Sua pregação era dura para com aqueles que iam ter com ele. João exortava, chamando-os de raça de víboras, afirmando que o fato de serem batizados não os livraria da ira vindoura, visto que eles não produziam frutos de arrependimento (Mt 3.1-9).

Suas ações estavam pautadas na certeza, por meio das Escrituras no Antigo Testamento, de que ele era aquele que viria à frente do Messias, preparando-lhe o caminho. Ao vir, o Messias derramaria o seu juízo, como ele afirma: “Já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo” (Mt 3.10). O Messias, dizia João Batista, batizaria com o Espírito Santo e com fogo. “A sua pá, ele a tem na mão e limpará completamente a sua eira; recolherá o seu trigo no celeiro, mas queimará a palha em fogo inextinguível” (Mt 3.10-12). Quando João viu a Jesus, afirmou: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29).

Todas as ações e sentimentos de João Batista tinham como raiz o seu entendimento daquilo que ele lia nos profetas. Sua convicção norteava a sua vida.

Não somente ele, mas também os demais judeus pensavam que na vinda do Messias o reino de Israel seria restaurado. Este entendimento fez com que os discípulos Tiago e João pedissem a Jesus para se assentarem, um à direita, outro à esquerda, quando ele estivesse em sua glória (Mc 10.35-37).

Acontece que, diferente do que eles esperavam, as coisas estavam acontecendo de outro modo. João Batista foi preso injustamente e isso abalou o seu entendimento acerca do Messias. A pergunta que ele mandou seus discípulos fazerem a Jesus deixa isso claro: “És tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar outro?” (Mt 11.2-3). De igual forma, os discípulos, após a crucificação do Senhor, estavam tristes e sem esperança. O relato acerca dos discípulos no caminho de Emaús demonstra claramente esta verdade (Lc 24.13-24).

Tanto a dúvida de João Batista como a tristeza dos discípulos de Emaús têm sua raiz no que eles estão entendendo naquele momento: Jesus não é o Messias, estávamos enganados. Era este falso entendimento que governava os seus corações, levando-os a agir e a pensar de forma errada.

Provérbios 23.6-7 adverte a não comer o pão do invejoso, “porque como imagina em sua alma, assim ele é”. A ideia é que o entendimento que o invejoso tem da situação em seu coração leva-o a agir de determinada maneira, daí o texto continuar dizendo: “ele te diz: Come e bebe; mas o seu coração não está contigo” ou, como traduz a NAA, “mas não está sendo sincero”. O que você entende a respeito de Deus determinará a forma como você olhará para a vida. O invejoso é aquele que quebra o 10º mandamento, ele cobiça, pois não confia no Deus que cuida dele.

Assim é também comigo e com você. Todas as nossas tristezas, ansiedades, ações erradas, são fruto de expectativas erradas. Expectativas erradas são fruto do desconhecimento ou do entendimento errado das verdades da Escritura Sagrada.

As igrejas estão repletas de crentes frustrados com a vida, pois esperavam que em Cristo seus problemas acabariam e isso não aconteceu. Aqueles que abraçam, por exemplo, a teologia da prosperidade, que ensina que crentes não adoecem, não têm problemas financeiros, nem passam por aflições, fatalmente irão se decepcionar em algum momento de sua caminhada.

É preciso, com o auxílio do Espírito do Senhor, estudar para conhecer corretamente a Palavra do Senhor. É ela que santifica a nossa vida, pensamentos e ações. Aqueles que estão em crise precisam ser reorientados a fim de olhar a vida pela perspectiva do Senhor. Foi isso que Jesus fez com João Batista e com os discípulos do caminho de Emaús.

Após ouvir a pergunta de João, Jesus respondeu: “Ide e anunciai a João o que estais ouvindo e vendo: os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e aos pobres está sendo pregado o evangelho. E bem-aventurado é aquele que não achar em mim motivo de tropeço” (Mt 11.4-6). Por que Jesus responde desta maneira? Se você olhar os textos de Isaías 29.18-19; 35.5-6; 26.19 e 61.1, verá que estava profetizado que o Messias faria tudo isso. Era como se Jesus estivesse dizendo: Não se preocupe, você não está enganado a respeito de mim. Tudo o que eu faço está registrado nos profetas. Viria ainda o dia do juízo, mas antes, o Senhor precisava redimir o seu povo. Aos discípulos de Emaús o Senhor explicou tudo o que os profetas disseram a respeito de sua morte e ressurreição (Lc 24.25-27). Aos discípulos, que mesmo após a ressurreição insistiam em querer saber acerca da restauração do reino, Jesus afirmou que não lhes competia saber a respeito de tempos e épocas, mas que eles receberiam o poder do Espírito Santo, tal qual profetizou Joel (At 1.6-8; Jl 2.28-32).

O que precisamos a fim de pensar e agir corretamente é entender de forma correta aquilo que o Senhor nos revelou. Temos o Espírito Santo, Mestre por excelência, que nos ilumina e nos conduz à verdade.

Quanto mais você conhecer o seu Senhor, menos expectativas falsas terá. Quanto menos expectativas falsas, menos ações erradas, menos emoções pecaminosas. Você aprenderá, dia a dia, a responder às circunstâncias de forma piedosa, honrando aquele que está, soberanamente, no controle de todas as coisas, incluindo o que ocorre em sua vida.

07 fevereiro 2019

O jesus “Geninho”

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No início da minha adolescência um dos desenhos animados que começaram a fazer sucesso foi She-Ra: A Princesa do Poder. A lembrança aqui é somente para destacar um dos personagens do desenho chamado, Geninho.

No final do primeiro episódio ele apareceu se apresentando mais ou menos assim: “Oi, eu sou o Geninho, descobriu onde eu estava hoje? Se não, tente outra vez”. Daí voltava uma das cenas do desenho e podia-se perceber que o Geninho estava escondido atrás de alguma árvore ou de algo que compunha a cena. Após se revelar, ele fazia um tipo de aplicação moral para as crianças. Uma das que me recordei, acessando o YouTube, é assim: “Na história de hoje o Troll teve um sonho. Quando penso em sonhos, penso logo em dormir. Da próxima vez que seus pais mandarem você dormir, lembre-se de que uma boa noite de sono é uma parte muito importante para manter a sua saúde. Tenha bons sonhos!”

Isso chamou a atenção das crianças na época, não pelos conselhos em si, mas pelo desafio de se achar o Geninho. Onde ele estará hoje? Quem conseguirá descobrir? Assim, a graça era tentar achar o personagem primeiro que os amigos que assistiam junto. Entretanto, preciso destacar algo aqui: Geralmente suas lições morais no fim do desenho eram totalmente desconectadas da história em si, como no caso citado acima onde uma cena de um Troll sonhando serviu de pretexto para uma lição (diga-se de passagem, correta) sobre a importância do sono para as crianças. Além disso, por mais que o Geninho aparecesse em todos os episódios, sua participação era irrelevante para a trama. Ele não ajudava ninguém, não interagia com ninguém, não dava dicas. Nada. Sua função era totalmente nula. Estando ou não ali, não fazia a menor diferença.

A esta altura alguns já devem ter entendido a razão de eu ter me referido no título ao jesus Geninho, mas vou ser direto. Ouvi dia desses mais um sermão que se enquadra exatamente nessa descrição. O texto foi lido, princípios morais foram extraídos da história e somente no final Jesus apareceu em umas três sentenças. Entretanto, se ele não tivesse sido sequer mencionado, não teria feito diferença alguma no sermão. Sua obra, que possibilitou redenção e vida, a fim de que pecadores imperfeitos possam viver de forma piedosa, não foi destacada, a glória devida ao seu nome, motivo pelo qual os princípios morais devem ser aplicados e vividos pelos crentes, não foi enfatizada, e sua presença nos crentes, que os capacita a viver desta maneira, não foi mencionada.

Assim é o jesus Geninho, ele até dá as caras, geralmente no fim do sermão, mas não passa de um personagem irrelevante, pois no decorrer do sermão, quem age, principalmente, é o homem com a finalidade de viver uma vida melhor, menos pesada, sem ressentimentos. Entretanto, um sermão que não enfatiza a Cristo e não dá a ele toda a glória não é sermão. Assemelha-se mais à uma palestra motivacional, dessas que são recheadas de frases de impacto e que estão na boca de qualquer coaching.

Cristãos precisam ouvir e conhecer acerca do seu Redentor. Os dilemas humanos, vividos por irmãos nossos do passado, e suas atitudes corretas diante de circunstâncias adversas não estão ali para mostrar que eles eram bons, mas o quanto a obra de Cristo os capacitou a honrar a Deus com suas atitudes. O resultado foi uma vida satisfeita, que só pode ser vivida de forma plena se os olhos estiverem no Salvador. É isso que você pode perceber em Paulo quando ele afirma: “Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação [...] tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4.11,13).

Jesus reprovou os religiosos judeus porque eles examinavam as Escrituras achando que encontrariam nelas a vida eterna, mas não queriam ir à ele, aquele de quem as Escrituras testificavam, a fim de ter vida (Jo 5.39-40). Pregadores precisam cuidar para não ensinar ao povo a fazer de forma semelhante, enfatizando os princípios a serem vividos, sem ensinar aos irmãos a impossibilidade de vivê-los plenamente sem Jesus Cristo que foi claro quando afirmou aos seus discípulos: “Eu sou a videira, vós os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer (Jo 15.5).

Toda a Escritura trata de Cristo, logo, ele precisa se visto na exposição do texto sagrado. Quando Jesus encontrou os discípulos tristes e preocupados no caminho de Emaús, perguntou-lhes a razão de estarem assim. Eles responderam que era por causa do que tinha acontecido a Jesus, o Nazareno. Eles esperavam que ele fosse o Messias, mas agora tinha sido morto pelas autoridades. Mesmo com a notícia de que as mulheres tinham ido ao túmulo e recebido do anjo a notícia de que ele vivia, a tristeza permanecia.

A partir daí, algo é muito interessante na narrativa. Jesus estava diante deles, mas não diz: Estou aqui, podem acreditar nesta notícia! Não, o Senhor primeiramente os repreende por causa de sua incredulidade. Eles não criam no que os profetas disseram a respeito de sua morte e ressurreição. A seguir, o texto diz que “começando por Moisés, discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as Escrituras (Lc 24.27). Isto não é curioso? Jesus busca trazer paz ao coração dos discípulos levando-os a vê-lo por meio das Escrituras.

O Jesus da Escritura está ali o tempo todo. Não irrelevante como o Geninho, mas atuando na história para redimir, restaurar, capacitar, instruir e tudo mais que seus irmãos adotivos precisarem para viver para a glória de Deus. É por isso que ele tem de ser claramente anunciado. Somente ele capacita os crentes a terem uma vida abundante, vivendo os princípios dados por Deus em sua Palavra.

02 fevereiro 2019

Faça certo pelos motivos certos

Resultado de imagem para crossTerminados os meus dias de férias eu estava pensando em um tema para o primeiro texto a ser escrito este ano e na lida diária com meus filhos, mais uma vez, o assunto das motivações do coração veio à tona. Calvino foi preciso quando afirmou que o coração do homem é uma perpétua fábrica de ídolos!

Acordamos e logo pela manhã havia algumas tarefas a serem feitas. Minha filha deveria arrumar a cama e meu filho ajudaria a mãe colocando os calçados que foram limpos na sapateira. Enquanto isso, conversando com minha esposa, mencionei que os deixaria assistir a um filme que eles estavam pedindo há dias. Minha esposa pediu que eu ligasse a TV somente depois que o mais novo terminasse a sua tarefa. A essa altura minha mais velha já estava no sofá, lendo um gibi.

Quando eu disse que eles iriam assistir o filme após o término da tarefa, mais que rapidamente minha menina disse: “Vou ajudar meu irmão!”, e levantou-se correndo para fazê-lo. Eis que surge, então, uma oportunidade de fazer o que ordenou o Senhor em Deuteronômio, inculcar aos filhos a Palavra, falando enquanto se está “assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te” (Dt 6.7).

Comecei falando à minha filha que ajudar o irmão era uma coisa muito boa. É importante demonstrar que problema não é necessariamente o que é feito, mas a razão para fazer o que se faz. Pais precisam ter o devido cuidado a fim de não desanimarem os filhos, somente mostrando que tudo o que fazem está errado, mas após falar que a ação foi boa, era hora de instruir o coração.

Perguntei o porquê de ela ter ido ajudar o irmão tão entusiasmada e rapidamente. A resposta não poderia ser outra: “porque quero assistir logo o filme!”. Tornei a perguntar se esta seria a razão certa para ajudar o irmão e ela logo fez uma carinha triste, entendendo o problema. Eu disse, então, que era preciso fazer coisas certas pela razão certa.

Meu objetivo com isso é um só. Ensinar a minha filha que é preciso amar a Deus e ao próximo, quando nos dispomos a fazer algo por outros. A glória de Deus, primeiramente, e o bem do outro, precisam ser os motivadores para as atitudes. Naquele momento, apesar de fazer algo bom e certo, ela agia motivada apenas pelo seu desejo de assistir ao filme. Possivelmente, se não houvesse um filme na história, ela continuaria assentada no sofá, lendo o seu gibi.

É claro que tudo isso também precisa ser dito a respeito de nós, pais. Ao ver as crianças fazendo o que é certo, ainda que somente externamente, é tentador querer usar os desejos do coração dos filhos para controla-los e adestra-los (sim, a palavra é essa). Dizer aos filhos que receberão um presente caso se comportem bem, não poucas vezes, “funciona”. O problema é que este caminho, geralmente mais rápido que o de gastar tempo tratando das motivações corretas, no máximo, fará com que os filhos se tornem fariseus ensimesmados, que enxergam o mundo girando ao seu redor, cuja única chance de deixarem a si mesmos de lado para ajudar a outros será quando for para conseguir o que seus corações tanto almejam.

Sim, filhos e pais agem de acordo com o que está em seus corações. É por isso que amar a Cristo precisa ser sempre o alvo maior. Quanto mais o amamos, mais temos condições de negarmos a nós mesmos (Mt 16.24).

Diante disso, os pais que querem cumprir o que ordena o Senhor em Deuteronômio, inculcando a Palavra aos filhos em todo o tempo, precisam ter em mente o que afirma o início do versículo 6.6: “Estas palavras que, hoje, te ordeno estarão no teu coração”. O ensino da Palavra aos filhos pressupõe que ela esteja já guardada no coração dos pais, de outra forma, o ensino será tal qual o dos escribas e fariseus que falavam e não faziam.

Mais importante ainda é lembrar a maior razão que temos a fim de fazer tudo para a glória de Deus: Cristo Jesus, nosso Senhor. É por causa de tudo o que ele fez de forma perfeita, cumprindo plenamente todos os mandamentos, assumindo sobre si os pecados do seu povo, sofrendo a punição que viria sobre nós, que não estamos mais debaixo da maldição e podemos viver para a glória de Deus. Fomos salvos pela graça, mediante a fé em Cristo, a fim de viver para Deus e não para nós mesmos. Paulo afirmou que “somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Ef 2.10). Essa deve ser nossa lembrança e assim devemos viver.

Cuide portanto, não somente daquilo que você faz, mas esteja bem atento às razões do seu coração. É importante, diante de tudo o que você vai fazer, considerar: Qual a razão para eu fazer isso? O que estou buscando? A quem estou querendo agradar? Perguntas como essas trazem à tona aquilo que está movendo a nossa vida.

Tenha como regra para si o que foi respondido por Jesus ao ser questionado sobre qual seria o grande mandamento da lei: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Desses dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas” (Mt 22.37-40. Assim. Fazendo o que fizer, você fará certo pelos motivos certos.

Para isso você foi salvo por Jesus!