Na vida tomamos várias decisões. Diariamente estamos diante de escolhas sobre o que fazer e o que não fazer e as fazemos de acordo com as inclinações do nosso coração.
É do coração que procedem as fontes da vida (Pv 4.23), aquilo que pensamos (Hb 4.12), falamos (Mt 15.18) e fazemos (Mt 15.19), razão de a Bíblia, insistentemente, chamar a atenção ao cuidado com o coração.
Pois bem, ao tomar decisões, inevitavelmente estaremos fazendo segundo o nosso coração. Algum cristão desavisado poderia pensar que, se é desta forma, as coisas estão resolvidas, pois o Senhor já nos deu um novo coração; mas apesar de essa ser uma verdade, ela não é toda a verdade. Esta consiste em entender que já fomos salvos e tivemos o coração renovado pelo Senhor, mas ainda não o fomos plenamente, o que só vai ocorrer por ocasião da vinda do Redentor (1Jo 3.2).
Infelizmente, até que chegue esse dia, ainda faremos escolhas e agiremos de forma errada e pecaminosa colhendo sempre os frutos disso. Não poucas vezes sofreremos com as nossas escolhas e atitudes e acabaremos lamentando o que foi feito. Nesses momentos é importante saber distinguir arrependimento de remorso, pois apesar de o resultado de ambos ser sofrimento e tristeza, a causa de um e de outro são bem distintas.
Pense, por exemplo, na história de Jacó e Esaú. Isaque sabia que o propósito de Deus era abençoar seu filho mais novo, Jacó, em vez do mais velho, Esaú. Apesar disso, ele tinha em seu coração o desejo de abençoar o mais velho. Pediu então que Esaú fosse caçar e que preparasse para ele uma comida saborosa, para depois ser abençoado.
Rebeca estava ouvindo os planos do marido e, quando Esaú saiu para caçar, tramou com Jacó um plano para enganar Isaque a fim de que ele abençoasse o mais moço. E assim foi feito. Enganado (mas não fora do propósito de Deus), Isaque abençoou a Jacó. Entretanto, quando Esaú chegou com sua caça e se deu conta de que o irmão havia “roubado” a sua bênção ficou amargurado e, chorando, pediu que o pai também o abençoasse, recebendo uma negativa como resposta (Gn 27.30-38). A partir de então, Esaú passou a odiar seu irmão por causa de ele ter sido abençoado e planejou matar a Jacó assim que Isaque falecesse (27.39).
É interessante notar como o Novo Testamento interpreta a história de Esaú. O escritor da carta aos hebreus exorta para que não haja na igreja “algum impuro ou profano, como foi Esaú, o qual, por um repasto, vendeu o seu direito de primogenitura. Pois também que, posteriormente, querendo herdar a bênção, foi rejeitado, pois não achou lugar de arrependimento, embora, com lágrimas, o tivesse buscado” (12.16-17).
A pergunta a ser respondida aqui é o que significa Esaú não ter achado lugar de arrependimento, principalmente quando sabemos que Deus não despreza um coração compungido e contrito (Sl 51.17).
Para ter essa resposta é preciso saber mais algumas informações a respeito da história de Esaú. Sendo o primogênito, a bênção era, por direito, dele. Entretanto, num dia em que estava faminto, pediu a Jacó um pouco do cozinhado de lentilhas que este havia feito. Jacó se aproveitou da situação para “comprar” o direito de primogenitura de Esaú que, desdenhando do seu privilégio respondeu: “Estou quase morrendo; de que me vale esse direito?” (Gn 25.32 – NVI).
O desejo por comida era tão grande que ele desdenhou de sua condição, preferindo um prato de lentilhas em vez da bênção do Senhor. Por conta disso é que o escritor de Hebreus o trata como um profano que, “por um repasto, vendeu seu direito de primogenitura”. O que ele buscou com lágrimas não foi o perdão, mas a bênção que havia perdido. O choro não era o lamento pelo pecado cometido contra Deus, de desprezar a bênção da primogenitura, mas somente pelo fato de ter perdido a bênção.
A diferença entre o remorso e o arrependimento é que este lamenta o pecado cometido enquanto aquele lamenta somente as consequências do pecado. É por causa dessa diferença que Paulo diz ter ficado alegre com a tristeza que sua carta produziu nos coríntios, mas não pela tristeza em si, e sim porque foi uma tristeza para arrependimento, e logo conclui: “Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação, que a ninguém traz pesar; mas a tristeza do mundo produz morte” (2Co 7.8-10).
Diante disso, temos de entender que o pecado não é ruim por causa das consequências e problemas que traz sobre nós, mas por causa da afronta que é feita a um Deus Santo. Infelizmente, muitos cristãos têm aprendido a lamentar as consequências do pecado e não o pecado em si.
Quando pais ensinam aos filhos que eles devem ser bons com os amigos para não os perder; jovens são estimulados a não se envolverem sexualmente antes do casamento para evitar filhos e, assim, não comprometerem os estudos; ou ainda quando maridos são ensinados a ajudar as esposas a fim de receberem algo em troca, o que está em jogo não é o pecado contra Deus, mas aquilo que se vai perder fazendo essas coisas. O produto final, quando há então a prática contrária ao que foi ensinado, não pode ser outro, senão o remorso.
Remorso é a tristeza autocentrada que lamenta, não o pecado contra Deus, mas as consequências de algum ato praticado. É o grito desesperado do ego que não conseguiu satisfação na ação que efetuou e ainda encontrou vergonha, dor, perda de prestígio, reputação, privilégios, etc. Essa é a tristeza do mundo, descrita por Paulo na segunda carta aos coríntios e que tem como consequência a morte.
Arrependimento é a tristeza que lamenta o pecado e a transgressão contra o Santo Deus e o conduz a buscar em Cristo o perdão com a mesma convicção de Davi: “Pequei contra ti, contra ti somente, e fiz o que é mau perante os teus olhos, de maneira que serás tido por justo no teu falar e puro no teu julgar”. Essa é “a tristeza segundo Deus [que] produz arrependimento para a salvação, [e] que a ninguém traz pesar” (2Co 7.10).
Se você quer viver para a glória de Deus lembre-se, então, que a tristeza segundo o mundo (remorso) sempre produzirá morte, mas a tristeza segundo Deus leva ao arrependimento e, consequentemente, ao perdão dos pecados e reconciliação com o Senhor.
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