João Batista despontava como um grande líder em seu tempo. Seu ministério de pregação ia bem e, conforme relata Mateus, “saíam a ter com ele Jerusalém, toda a Judeia e toda a circunvizinhança do Jordão; e eram por ele batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados” (Mt 3.5). João não negociava a mensagem, não queria simplesmente mais adeptos, mas ver vidas transformadas. Quando percebeu que muitos fariseus e saduceus apresentavam-se ao batismo exortou duramente: “Raça de víboras, quem vos induziu a fugir da ira vindoura? Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento” (Mt 3.5-8).
Numa ocasião o próprio Jesus se apresentou ao batismo e, mesmo diante da tentativa de dissuasão de João Batista, que dizia que ele é quem precisava ser batizado pelo Senhor, foi batizado para que se cumprisse toda a justiça (cf. Mt 3.13-15). Outro João, o evangelista, relata que após isso o Batista estava em companhia de dois discípulos quando viu passar a Jesus. Prontamente ele afirmou que ia ali o Cordeiro de Deus e seus dois discípulos seguiram o Senhor. João Batista preocupava-se em exaltar a Cristo.
Aconteceu que num dia os discípulos de João Batista discutiram com um judeu sobre a purificação e chegaram a João com uma “queixa”, dizendo: “Mestre, aquele que estava contigo além do Jordão, do qual tens dado testemunho, está batizando, e todos lhe saem ao encontro” (Jo 3.26).
Ao saber da notícia João tomou uma rápida providência. Reuniu sua equipe de marketing e decidiu inaugurar um novo templo com uma grande placa na frente na qual se podia ler: “Igreja Intercontinental Precursora do Cordeiro” e em letras garrafais: “MINISTÉRIO PROFETA JOÃO BATISTA”. Estampou, também, na placa, uma foto sua com um sorriso forçado e um pedaço de pergaminho na mão, para deixar bem claro quem era o líder daquela comunidade.
Calma! Eu sei que o que está no parágrafo acima não aconteceu. Esta última parte foi uma divagação da minha mente ao pensar no que talvez tivesse acontecido, caso no lugar de João Batista estivessem muitos dos líderes evangélicos de nossos dias.
Vivemos dias difíceis. Dias em que, por parte de muitos líderes, há uma busca pela autoglorificação e, por conta disso, uma propaganda acentuada de seus ministérios ao mesmo tempo em que Cristo é cada vez menos anunciado. Por parte dos crentes, uma louvação a homens e a esperança de que eles são os responsáveis pelo sucesso da igreja. Isso explica o fato de não se colocar apenas o nome da denominação na placa, para indicar que é uma igreja cristã, mas de colocar também o nome da “estrela principal” para aquele grupo.
Gostaria de poder dizer que esse é um fenômeno presente somente em igrejas neopentecostais, mas a realidade aponta para outra direção. Infelizmente, até nos arraiais tradicionais há a tendência de exaltar homens e de achar que um ou outro ministro são essenciais para que a denominação vá bem.
Certa vez ouvi um pastor afirmar que determinado presbitério não estava crescendo e que algo deveria ser feito em relação a isso, mas, em vez de propor que os Conselhos das igrejas zelassem mais pela exposição fiel da Palavra de Deus e dependessem do Espírito Santo que convence o homem do pecado, da justiça e do juízo, a proposta foi: “Deveríamos fazer uma grande cruzada e convidar o Rev. Fulano de Tal para pregar, isso iria encher as igrejas do nosso presbitério”. Há alguns anos a Associação Billy Graham promoveu em nosso país o “Minha Esperança Brasil” e o modelo era o mesmo, centrado na pessoa de um pregador. O projeto consistia em convidar amigos e vizinhos não crentes para irem à sua casa assistir aos programas que teriam como pregadores Billy e Frank Graham, como se a mensagem pregada por esses irmãos fosse mais eficaz que a pregada pelos demais cristãos.
É claro que não estou negando que existem homens mais preparados ou capacitados. Não seria tolo a esse ponto. O Senhor distribuiu dons à sua igreja para que ela fosse equipada e edificada. Sei que ele concedeu “uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo” (Ef 4.11-12). O meu ponto é que, por mais capacitados que sejam os homens, a glória nunca pode ser deles nem a confiança do povo deve estar depositada neles ou, em outras palavras, a glória e a esperança não devem estar nos que são capacitados, mas naquele que os capacita.
É sempre uma tentação para qualquer pregador o aceitar glória para si, mas temos exemplos bíblicos que nos chamam à sensatez. Pense, por exemplo, no apóstolo Paulo. Ele mesmo afirma que tinha propensão à soberba e que, por conta disso, foi-lhe posto um espinho na carne para humilhá-lo (2Co 12.7). Curiosamente, quando pregava em Filipos, lidou com uma tentação exatamente nessa área. Por muitos dias, uma jovem adivinhadora andava após ele e seus companheiros dizendo: “Estes homens são servos do Deus Altíssimo e vos anunciam o caminho da salvação” (At 16.17). Imagine alguém elogiando a sua performance como pregador. O que você faria? O que Paulo fez foi se indignar e repreender o espírito imundo daquela mulher (At 16.18). Foi o mesmo Paulo que exortou aos romanos: “Porque, pela graça que me foi dada, digo a cada um de vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, segundo a medida da fé que Deus repartiu a cada um” (Rm 12.3).
Voltando a João Batista, o que ele fez diante da tentação de se enciumar com o ministério de Cristo foi humildemente reconhecer que o ministério de Cristo vinha da parte do Senhor (Jo 3.27), reconhecer que ele não era o Cristo, mas seu precursor (Jo 3.28) e reafirmar a sua alegria de, como “amigo do noivo”, ver o noivo ser exaltado (Jo 3.29).
Quanto a nós, cabe-nos humildemente cumprir nosso chamado de proclamar o Redentor e, fazendo coro com o Batista, afirmar: “Convém que ele cresça e que eu diminua” (Jo 3.30).
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