03 fevereiro 2017

Autoridade, autoritários e anarquistas

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As autoridades procedem de Deus. Sim, é verdade, está nas Escrituras Sagradas. Paulo afirmou categoricamente aos Romanos que “não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas” (Rm 13.1). A ordem da criação aponta para esta sublime realidade.

Digo que é uma realidade sublime “porque o Senhor é o Deus supremo e o grande Rei acima de todos os deuses” (Sl 95.3) além de ser o Soberano Senhor que criou todas as coisas (At 4.24; Ne 9.6). Ele é a Suprema autoridade e, na criação, estabeleceu todas as coisas sob a estrutura de autoridade. Deus, o Soberano, criou Adão e de Adão criou Eva, para ser sua auxiliadora idônea (Gn 2.18). O homem se submeteria a Deus e a mulher ao homem e a Deus.

É claro que essa submissão não implica inferioridade. Paulo explica bem esse ponto quando diz aos coríntios: “Quero, entretanto, que saibais ser Cristo o cabeça de todo homem, e o homem, o cabeça da mulher, e Deus, o cabeça de Cristo” (1Co 11.3). Dizer que a mulher é inferior por ser submissa ao homem seria o mesmo que dizer que Cristo é inferior ao Pai, o que constitui uma heresia.

O mesmo princípio de autoridade é visto nos pais, em relação aos filhos, nos presbíteros em relação às ovelhas e nos governos em relação ao povo, por exemplo. Por essa razão os Puritanos entendiam que a quebra do 5º mandamento não se limitava à desobediência aos pais. Na resposta à pergunta 124 do Catecismo Maior de Westminster lemos que “as palavras ‘pai’ e ‘mãe’, no quinto mandamento, abrangem não somente os próprios pais, mas também todos os superiores em idade e dons, e especialmente todos aqueles que, por ordenação de Deus, estão colocados sobre nós em autoridade, quer na família, quer na Igreja, quer no Estado”.

Algo deve ser destacado aqui. A posição bíblica de autoridade implica no cuidado para com aqueles que estão sob autoridade. Deus, o Soberano Senhor, proveu para o homem tudo o que lhe era necessário por ocasião da criação e o homem deveria refletir esse cuidado para com a mulher (e futuramente filhos) instruindo-a a respeito da vontade do Senhor e sendo o mantenedor de sua casa.

Com a entrada do pecado veio a corrupção da estrutura de autoridade. É interessante notar algo na tentação. Satanás se dirige primeiramente à mulher, que deveria ser submissa ao homem e à Deus, e propõe a anarquia. Pense um pouco sobre a afirmação da serpente: Deus proibiu comer o fruto, pois sabia que eles seriam como ele, conhecedores do bem e do mal (Cf. Gn 3.1-5). Segundo as palavras de Satanás, não haveria mais submissão, todos estariam em pé de igualdade, inclusive em relação a Deus. Daí o Senhor, ao punir o pecado, lembrar que ela continuaria submissa ao marido que continuaria a governa-la (Gn 3.16). O grande problema é que, em pecado e rebelião contra Deus, a submissão seria bastante difícil e traria muitos conflitos.

Cristãos devem lutar contra o ímpeto anarquista. Esposas devem submeter-se ao marido, como a igreja é submissa a Cristo. O movimento feminista e sua ânsia de “empoderar” as mulheres não difere em nada de Satanás que propôs o “empoderamento” de Eva a fim de ser como Deus. Irmãs, cuidem para não sucumbir à voz do tentador que continua a ecoar desde o Éden. Filhos devem obedecer a seus pais, sabendo que não são seus iguais. Ovelhas devem dar ouvidos a seus pastores, como instrui o escritor aos Hebreus: “Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isso com alegria e não gemendo; porque isso não aproveita a vós outros” (Hb 13.17). Cidadãos devem respeitar seus governantes e orar por eles (Rm 13.1; Tt 3.1; 1Pe 2.13; 1Tm 2.1-2) a fim de honrarem a Deus.

É claro que há limites para a submissão às autoridades. Se formos ordenados a pecar contra Deus, importa obedecer a Deus que aos homens (At 5.29) e isso nos leva ao outro lado da moeda, ou melhor, da distorção da estrutura de autoridade, como você notará.

Se a anarquia é pecaminosa, pois anseia a ausência de autoridade, estabelecida por Deus na criação, a tirania, que é o extrapolar da autoridade, colocando a vontade do governante acima das leis, não é menos pecaminosa. Isso pode ser visto já em Gênesis quando Lameque chama suas esposas e as amedronta ao se gabar de sua violência contra um homem que o havia ferido e um rapaz que tinha esbarrado nele (Gn 4.23).

Governar infligindo medo é tirania e muitos governantes, pastores e pais acabam pecando desta forma. Mas outra forma mais sútil de tirania, pois para muitos é expressão da autoridade bíblica, é quando se exige obediência cega. Esse tipo de obediência é visto na história quando governantes, por mais corruptos e injustos que sejam, são venerados por seus súditos. Isso pode acontecer na igreja, daí a exortação de Pedro para que os presbíteros pastoreiem não como dominadores do rebanho, mas como modelos (1Pe 5.3). Isso acontece em famílias, quando os pais dão determinadas ordens aos filhos sem explicar as razões para tal. Isso é tirania.

Cristãos podem e devem evitar agir assim pois estão unidos a Cristo e são habilitados a cumprir o que ele ordena. Mais ainda, porque têm nele o grande exemplo de liderança.

Jesus, o único que poderia exigir obediência sem explicar as razões, disse a seus discípulos: “Já não vos chamo servos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer”. Com isso Jesus não estava propondo igualdade. Ele afirmou isso após condicionar a amizade à obediência dizendo “vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando” (Jo 15.14,15). Ele também havia dito: “Vós me chamais o Mestre e o Senhor e dizeis bem; porque eu o sou” (Jo 13.13).

Jesus se disse amigo, pois para haver amizade é preciso se dar a conhecer, é preciso revelação. E ele revelava a seus discípulos a vontade de seu Pai. Por saber as razões para a obediência é que João pôde escrever que “os mandamentos não são penosos” (1Jo 5.3). Jesus não é um tirano que exige obediência cega, pais, governantes e pastores também não podem ser. Jesus também serve e cuida dos que estão sob sua autoridade e demonstrou isso na prática ao lavar os pés aos discípulos, mesmo assentindo que ele era o Mestre e o Senhor (Jo 13.14).

Se você está em posição de autoridade, mire-se em seu Senhor. Se você está em posição de submissão, mire-se nele também, pois em submissão ao Pai “a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz” (Fp 2.8). Com ele aprendemos e nele somos capacitados a lidar com a autoridade, não sendo anarquistas nem tampouco tiranos.

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