27 março 2024

A sarça representa Deus?

E nas redes sociais continua a polêmica acerca da série The Chosen. A questão discutida é se a série configura ou não a quebra do 2º mandamento. Bem antes da atual polêmica, mais precisamente em dezembro de 2022, eu estava expondo mais uma vez os 10 mandamentos, desta feita em nossos cultos da manhã, e como de costume destaquei um trecho em que citei a série como exemplo da quebra do 2º mandamento e coloquei em minha rede social.

A razão para meu posicionamento é a resposta à pergunta 109 do Catecismo Maior de Westminster, “Quais são os pecados proibidos no segundo mandamento?”. Dentre outros pecados estão o “fazer qualquer imagem de Deus, de todas ou de qualquer das três Pessoas, quer interiormente no espírito, quer exteriormente, em qualquer forma de imagem ou semelhança de alguma criatura; toda adoração dela, ou de Deus nela e por meio dela;”.

Note que a resposta traz dois pecados distintos: um é o de fazer qualquer imagem e o outro de adorar por meio delas. Isso não deveria ser motivo de espanto para nenhum reformado, tampouco para os presbiterianos, pois o testemunho das confissões e de muitos irmãos piedosos a este respeito é abundante.

Pois bem, em meio à atual polêmica, um perfil do Instagram repostou o trecho que já estava na internet há mais de um ano, mas desta vez houve muitas reações. Fui dar uma olhada nos comentários e, em meio à muitas ofensas gratuitas, duas questões me chamaram a atenção.

A primeira foi o comentário que dizia que a preocupação maior de um presbiteriano não é ser cristão, mas ser presbiteriano de forma correta. O irmão que fez tal comentário, não sei se sem pensar ou por total falta de discernimento, ignora o fato que dentro do cristianismo há tradições diferentes. Só para ficar no âmbito protestante, isso seria o mesmo que condenar um pastor batista que se esforça para ensinar a um membro de “sua” igreja que pediu para batizar seu bebê que tal prática é errada. Se ele está dentro de sua tradição, seria uma bobagem eu dizer que a preocupação maior de um batista não é ser cristão, mas ser batista do jeito certo.

Pela graça de Deus sou um ministro presbiteriano! Como tal, subscrevo e reconheço como sistema expositivo de doutrina e prática a Confissão de Fé e os Catecismos Maior e Breve de Westminster. Sou chamado a ensinar um rebanho de cristãos presbiterianos, conforme o que entendemos ser o fiel ensino das Escrituras e que está exposto nos símbolos de fé.

Somos cristãos e, dentro do grande número de denominações existentes, temos uma identidade específica, sendo herdeiros de uma rica herança doutrinária. É claro que me preocupo em sermos presbiterianos da forma correta. Fosse se outra forma eu seria um perjuro, um desonesto, que jurou fidelidade às Escrituras, conforme a interpretação dos símbolos de fé, mas somente da boca pra fora. Concordo plenamente com o Rev. Boanerges Ribeiro: “Ninguém nos obriga a ser presbiterianos. Mas, se queremos sê-lo, sejamo-lo honradamente”.

A segunda questão que me chamou a atenção tem a ver com o título do presente texto. Um irmão comentou que é curioso o fato do símbolo da IPB ser justamente a sarça que, segundo ele, representa a presença de Deus e que este símbolo não seria aceito por nenhum dos delegados de Westminster que escreveram a confissão que subscrevemos.

Mas será que as coisas são, de fato, assim? Penso que não é algo tão difícil de se descobrir! A primeira sessão da Assembleia ocorreu em 1º de julho de 1643, reunindo 121 teólogos na Abadia de Westminster, em Londres, e terminando seus trabalhos em 1653.

Aaron Denlinger, professor de História da Igreja e Teologia Histórica no Reformation Bible College, escreveu um artigo intitulado O símbolo da sarça ardente na história da Igreja. O artigo está postado no site do Ligonier para mostrar “por que a Bíblia de Estudo da Reforma usa o símbolo da sarça ardente”.

No artigo ele aponta que um grupo de ministros huguenotes, reunidos em 1583 para sua reunião de sínodo, entenderam que

“a sua igreja deveria ter um selo oficial, algo que pudesse ser afixado nas decisões oficiais de seus sínodos, servido assim como um sinal da autenticidade e autoridade delas” [...] “No seu centro estava a sarça ardente retratada em Êxodo 3 – aquela sarça de onde Deus falou a Moisés e finalmente revelou seu nome: ‘Eu sou quem sou’. No meio da sarça, o nome de Yahweh estava gravado em letras hebraicas. Num padrão circular ao redor do arbusto apareceu a frase latina Flagror non consumor – ‘Eu queimo, [mas] não sou consumido”[1].

Isto quer dizer que, pelo menos 60 anos da Assembleia de Westminster, “a incipente Igreja Reformada da França” já utilizava este símbolo. Logo, certamente era ele de conhecimento dos delegados de Westminster. Prova disso é que com o restabelecimento do presbiterianismo em 1690, a Igreja da Escócia começou a usar o símbolo meio que por acidente, como aponta Denlinger no mesmo artigo, pois o encarregado por imprimir as atas das assembleias anuais resolveu “incluir na página de título do primeiro e dos subsequentes Atos da Assembleia publicados uma imagem circular da sarça ardente, completa com a frase latina sobrescrita Nec tamem consumibatur (ainda não foi consumido)”.

A tese de que nenhum dos delegados de Westminster aceitariam tal símbolo, portanto, não se sustenta. Mas fica ainda uma questão. Como poderiam aqueles que condenaram qualquer representação das Pessoas da Trindade acatar como símbolo uma imagem que representa Deus? Isto não é, no mínimo, incoerente?

Se esta fosse a resposta, provaria algo que nós já sabemos. Eram homens pecadores. Contudo, neste caso, não houve incoerência. A questão é simples: eles não consideravam a sarça ardente uma representação de Deus.

É fácil constatar isto. Em seu comentário de Êxodo, o pastor puritano Mattew Henry (1662-1714) diz que

“a sarça ardia no fogo, porém não se consumia. Esta era uma representação da igreja que agora estava escravizada no Egito, queimando nos fornos de cozer tijolos, mas que não se consumia. Perplexos, mas não desanimados, abatidos, mas não destruídos”[2].

Spurgeon, que viveu muitos anos depois de Henry (1834-1892), em suas notas no comentário do Salmo 119.153 registra:

“Olha para a minha aflição. Estas orações de Davi são escritas com tal sabedoria celestial que são convenientes para a condição de toda a igreja e de cada um de seus membros. A igreja é a sarça que arde com o fogo, mas não pode ser consumida; cada membro da igreja traz uma parte da cruz de Cristo; os membros jamais estarão sem aflição, e por este motivo precisam orar, como Davi: ‘olha para a minha aflição’”[3].

Entretanto, bem antes de Henry e Spurgeon, João Calvino (1509-1564) comentou:

“É verdade que falamos um pouco da sarça ardente. É comum que Deus aplique os sinais às coisas com uma certa probabilidade, e esta é quase a ordem e o modo comuns dos sacramentos. Além disso, esta foi a coisa mais adequada que poderia ter sido mostrada a Moisés, para confirmar sua fé no presente negócio. Ele sabia em que estado havia deixado sua nação. Embora houvesse um número maior de homens, eles não eram diferentes de um arbusto. Pois quanto mais espessa for a sarça, e quanto mais arbustos ela tiver, mais sujeito estará a pegar fogo, para que possa queimar por todos os lados; portanto, o povo de Israel era apenas um bando fraco e exposto a todos os ferimentos; e essa multidão nada guerreira, sendo pressionada até mesmo com seu próprio peso, incensou a crueldade do Faraó apenas com o sucesso próspero do aumento. Portanto, o povo sendo oprimido pela tirania cruel é, por assim dizer, uma pilha de lenha incendiada em cada canto, e não há nada que o impeça de ser reduzido a cinzas, exceto isto, porque o Senhor está sentado no meio dele; e embora o indubitável fogo da perseguição tenha ardido então, ainda assim, porque a Igreja de Deus nunca está livre de aflições no mundo, seu estado contínuo é, de certa forma, pintado neste lugar. Para que outra coisa somos senão combustível para o fogo? E espalham-se continuamente inúmeras marcas de fogo de Satanás, que incendiam tanto nossos corpos como também nossas mentes; mas o Senhor nos livra e nos defende, por sua maravilhosa e singular bondade, de sermos consumidos. Portanto, o fogo precisa queimar, para que possa nos queimar nesta vida; mas porque o Senhor habita no meio de nós, ele nos preservará de tal forma que as aflições não nos farão mal, como também é dito no Salmo 46 ( Salmo 46:5 )”[4] (Google tradutor).

Está bem claro que para Henry, Spurgeon e Calvino a sarça não é uma representação de Deus. A sarça representa a Igreja que, apesar de sofrer no decorrer da história, não será consumida pelo fogo da aflição por contar com a presença do Senhor no meio dela. O Salmo 46.5 citado por Calvino aponta exatamente para isso: “Deus está no meio dela; jamais será abalada; Deus ajudará desde antemanhã”.

Não! A sarça não represente Deus, mas a Igreja! Você pode até discordar da interpretação dos nossos irmãos do passado, mas não pode acusá-los de ser incoerentes, tampouco dizer que eles não aceitariam a sarça ardente como um símbolo da igreja. Eles não só aceitariam, como este é um símbolo que perdura há séculos nas igrejas reformadas.

Quanto a mim, como ministro presbiteriano que sou, continuarei ensinando as Escrituras, conforme a interpretação dos símbolos de Westminster, os quais subscrevi em minha ordenação. Continuarei admirando a sarça usada pelos presbiterianos e por reformados ao redor do mundo, concordando plenamente com Henry, Spurgeon, Calvino e muitos outros. Continuarei empenhado em convencer os presbiterianos a serem presbiterianos de fato.

Quando aos irmãos de outras denominações, continuarei a respeitá-los, ainda que discordem da minha posição. Meu problema não é com eles, mas com supostos presbiterianos que querem transformar a nossa igreja em outra denominação. Reverberando as palavras do Rev. Boanerges digo: Se querem ser presbiterianos, que o sejam honradamente.


[1] https://www.ligonier.org/learn/articles/symbol-burning-bush-church-history acessado em 27/03/2024

[2] Mattew Henry. Comentário Bíblico AT vol. 1 – p. 765

[3] C. H. Spurgeon. Tesouros de Davi vol. 3 – p. 498

[4] Calvino comentando Atos 7.30

02 fevereiro 2024

O presidente do Conselho vota?

Este é um assunto que vez por outra traz certo incômodo, leva a constrangimentos e suscita discussões nas Igrejas federadas à Igreja Presbiteriana do Brasil. Há quem defenda que o presidente dos concílios, sobretudo o presidente do Conselho da Igreja, só vota em caso de desempate ao fazer uso do chamado “voto de qualidade” ou “voto de desempate”.

É preciso recorrer ao Manual Presbiteriano a fim de pensarmos na questão. Primeiramente chamo a atenção ao que preceitua o Art. 3 da CI/IPB: “O poder da igreja é espiritual e administrativo, residindo na corporação, isto é, nos que governam e nos que são governados”.

O §2º do mesmo artigo explica como se dá o exercício de autoridade dos que governam: “A autoridade dos que governam é de ordem e de jurisdição. [...] É de jurisdição, quando exercida coletivamente por oficiais, em Concílios, para legislar, julgar, admitir, excluir ou transferir membros e administrar comunidades” (destaques meus).

Atente bem aos destaques, pois estas expressões são imprescindíveis para entender o que vem a seguir.

Concílios, conforme a CI/IPB “são assembleias constituídas de ministros e presbíteros regentes” (Art. 59). São eles: “Conselho da Igreja, Presbitério, Sínodo e Supremo Concílio” (Art. 60). O artigo 61 afirma que casa um deles exerce “jurisdição original e exclusiva sobre todas as matérias da sua competência”.

Ao tratar dos membros do Concílio, a CI estabelece diferenças: Somente membros “efetivos”, a saber, “ministros e presbíteros que constituem os Concílios, bem como o presidente da legislatura anterior” (Art. 66 letra “a”) têm o direito de votar. Os membros “ex-offício” (letra b) e “correspondentes” (letra c) podem usar a palavra, mas sem direito a voto e no caso de membros “visitantes”, sequer podem fazer uso da palavra, podendo apenas tomar assento na reunião (letra d).

Agora preste bem a sua atenção ao Parágrafo único deste artigo: “O disposto na alínea b deste artigo não se aplica aos Conselhos”. Qual a razão de ser deste parágrafo?

O Art. 75 reza que “o Conselho da Igreja é o Concílio que exerce jurisdição sobre uma Igreja e é composto do pastor, ou pastores, e dos presbíteros”. Lembre-se de que a jurisdição “é exercida coletivamente por oficiais, em Concílios, para legislar, julgar, admitir, excluir ou transferir membros e administrar comunidades”.

Para exercer jurisdição sobre a igreja o Conselho precisa votar! Se a jurisdição é exercida coletivamente por docentes e regentes, todos precisam ter direito a voto, mas ao olhar para o Art. 78 em seu § 3º nota-se que “havendo mais de um pastor, a presidência será alternada, salvo outro entendimento; se todos estiverem presentes, o que não presidir terá direito a voto.

É preciso entender bem este parágrafo, pois é a partir dele que surge a controvérsia acerca de o presidente do Conselho poder ou não votar.

O Art. 30 define que “o Ministro do Evangelho é o oficial consagrado pela Igreja, representada no Presbitério, para dedicar-se especialmente à pregação da Palavra de Deus, administrar os sacramentos, edificar os crentes e participar, com os presbíteros regentes, do governo e disciplina da comunidade, ou seja, junto com os regentes ele tem jurisdição sobre a igreja.

Estou insistindo na questão da jurisdição por uma razão importante. O Art. 33 estabelece que “o ministro poderá ser designado pastor efetivo, pastor auxiliar, pastor evangelista e missionário”. Ao olhar para a definição de cada um deles você percebe que o Efetivo é eleito pela igreja ou designado pelo Presbitério. Ele tem jurisdição sobe a igreja, junto com os regentes (§ 1º).

Entretanto, “é pastor auxiliar o ministro que trabalha sob a direção do pastor, sem jurisdição sobre a Igreja, com voto, porém, no Conselho, onde tem assento ex-officio [...]” (§2º).

Aqui você já percebe algumas coisas. Primeiramente a razão de haver o parágrafo único do Art. 66. Lá é dito que membros ex-officio dos concílios “gozam de todos os direitos, menos o de votar”, exceto no caso de Conselho da Igreja, concílio em que o ministro tem assento ex-officio com direito à voto.

Algo deve chamar a sua atenção aqui! Se o pastor auxiliar não tem jurisdição sobre a Igreja, por que razão ele tem direito à voto, visto que é por meio do voto que o Ministro participa “com os presbíteros regentes, do governo e disciplina da comunidade” (Art. 30)? Voltemos, então, ao Art. 78 § 3º:

a) “Havendo mais de um pastor” – Um efetivo e seu auxiliar;

b) “a presidência será alternada, salvo outro entendimento” – Como o auxiliar trabalha “sob a direção” do efetivo, cabe a este definir se haverá ou não alternância;

c) “se todos estiverem presentes, o que não presidir terá direito a voto” – O espírito da lei aqui parece ser o de impedir que o efetivo tenha “dois votos”. O dele, por direito, e o do auxiliar que trabalha sob sua direção.

Considerando que o auxiliar não tem jurisdição sobre a Igreja, em tese, ele nem precisaria estar presente na reunião, por não ter direito a voto. Neste caso, havendo somente o Pastor efetivo na reunião ele vota livremente em qualquer matéria, caso entenda que deva. É seu direito constitucional e dever de ofício na jurisdição da Igreja junto aos regentes.

Entretanto, caso todos estejam presentes, somente o que não presidir terá direito a voto. Desta forma, ou o Pastor Efetivo, se quiser votar, passa a presidência ao auxiliar, ou, se preferir presidir, dá ao auxiliar o direito de voto.

Desta maneira, somente em Igrejas em que haja mais de um pastor é que o Presidente do Conselho não pode votar. Se não for assim, estaremos diante de uma situação, no mínimo, estranha em que um Pastor efetivo, eleito ou designado, é impedido de exercer jurisdição sobre a Igreja, enquanto o auxiliar, que a CI/IPB afirma categoricamente não ter jurisdição sobre a Igreja, ganha o direito de... “jurisdicionar a Igreja por meio do seu voto”. Isto é claramente contraditório.

Ao consultar o Digesto Presbiteriano percebe-se que desde 1970 tem sido entendimento da Igreja Presbiteriana do Brasil que o Presidente pode votar, como segue:

“CE - 1970 - DOC. LX: Consulta Sobre Voto de Desempate - Doc. LVII - Quanto ao Doc. 57, consulta sobre voto desempate pelos presidentes de concílios, a CE-SC/IPB: [...] resolve: Reconhecer ao Presidente de um concílio o direito de dar o seu voto nos casos de empate, independentemente do seu direito de votar também como membro efetivo do seu concílio.”

“CE - 2003 - DOC. VI: Quanto ao Doc. 75 da CE/SC-IPB 2003: Quanto ao Documento 17, da CE-SC/2002, encaminhando documento do Sínodo Norte Paulistano, que por sua vez, encaminha documento do Presbitério Norte Paulistano, solicitando que o SC-IPB tome nula a resolução SC-90 Doc. CXL, sobre voto de desempate nos Concílios. Considerando: 1 – Que o presidente de um Concílio é seu membro efetivo (Art. 66, alínea “a” CI-IPB), tendo, portanto direito a votar, como os demais membros efetivos; 2) Que o presidente de um Concílio, em caso de empate em uma votação, inclusive quanto da eleição da Mesa, deve dar o seu voto de desempate, nada obstante, ter votado anteriormente (Art. 8, alínea “I” RI-SC-IPB e outros); 3 – Que mesmo causando-lhe certo constrangimento é seu dever de ofício proceder a este ato; 4 – Que certamente ao fazê-lo não será movido por questões pessoais, mas levando em consideração o bem do Concílio e sua consciência. O Supremo Concílio Resolve: 1 – Revogar a resolução SC/90, Doc. CXL. 2 – Reiterar quem em casos desta natureza, o presidente exerça livremente o seu dever constitucional”.

“SC - 2018 - DOC. CCXVIII: Quanto ao documento 227 – [...] Resolve: [...] 4. Esclarecer que o critério de desempate a ser adotado nas eleições para os cargos da mesa Diretora e nas demais decisões dos Presbitérios será o voto do Presidente, nada obstante o seu direito de ter votado anteriormente, como membro efetivo de seu Concílio; 5. Reconhecer a vigência da Resolução Doc. 060 da CE-SC/IPB-1970;”

Diante do exposto, fica evidente que o Presidente do Conselho, bem como os presidentes dos demais concílios da IPB tem direito a votar as matérias livremente e, se for o caso, por dever de ofício, dar também o voto de desempate.

Neste ponto, pensando na questão ética e no espírito da lei, coloco duas questões:

1. Poder e dever são duas coisas bem distintas. Particularmente, creio que o pastor não deve se furtar de votar nas matérias que envolvem o pastoreio da Igreja (jurisdição), mas que deve se abster quando se tratar de matéria que o envolva diretamente, como por exemplo, aumento salarial. Imagine, por exemplo, um cenário em que o resultado ficou 3 x 2 com o voto dos regentes e o docente usa seu direito de voto para empatar e posteriormente desempatar a matéria. A não ser que seja o caso de ele votar e desempatar em desfavor próprio, em minha opinião a atitude seria imoral;

2. Uma segunda questão diz respeito ao que temos em algumas Igrejas hoje e que, certamente, não era comum em 1950 quando foi promulgada a CI/IPB, o fato de haver igrejas com mais de um pastor auxiliar. Digo isto porque o texto constitucional afirma que “se todos [os pastores] estiverem presentes, o que não presidir terá direito a voto”. Perceba que não são os que não presidirem, mas o que não presidir.

Imagine o caso de um Efetivo que tenha 6 regentes e 4 pastores auxiliares. Estando os auxiliares sob sua direção, não é incomum que votem com o “chefe”. Desta forma, bastariam dois regentes para o pastor efetivo aprovar o que quisesse na igreja. Isso mata o sistema presbiteriano!

Talvez aqui alguém objete que há Efetivos que deixam seus auxiliares livres para votar como quiserem, mesmo que seja contra a sua posição. Ainda que aconteça, entendo que está errado, pois 4 pastores auxiliares que não foram eleitos pela igreja e que não tem jurisdição sobre ela estariam decidindo as matérias, usurpando o direito dos regentes que foram devidamente eleitos pela igreja e que, em decorrência disso, têm sobre ela a jurisdição espiritual.

Neste caso, apesar de a letra fria da lei permitir que todos os auxiliares votem por não estarem presidindo, penso que tal ato vai contra o espírito da lei que promove o pastoreio por parte do Conselho, a saber, presbíteros eleitos pela igreja e o pastor eleito ou designado pelo presbitério para tal fim, estes sim, com pleno direito de governar os que estão sob sua jurisdição.

Penso que este entendimento pode colocar fim às disputas carnais que muitas vezes ocorrem no âmbito da Igreja, onde Ministros querem se valer dos seus auxiliares para executar sua vontade e presbíteros querem tratar pastores efetivos como meros executores daquilo que eles decidem “sozinhos”, sem o voto do Presbítero Docente que foi igualmente eleito pela igreja. É bom lembrar que “o presbítero tem nos Concílios da igreja autoridade igual a dos ministros” (CI/IPB Art. 52). Notem bem, não superior, nem inferior, mas igual.

Desta forma, em suas decisões, o Concílio pode afirmar sem hipocrisia: “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós” (At 15.28) e, sujeitos a Cristo, o Supremo Pastor, presbíteros docentes e regentes podem pastorear fielmente o rebanho que lhes foi confiado, para a glória de Deus!